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Por uma década, Esteban Cambiasso foi o fiel da balança de uma Inter estratosférica

O mês de setembro de 2017 ficou marcado pela aposentadoria de uma lenda do futebol dos anos 2000: Esteban Matías Cambiasso Delau, ou El Cuchu, como o desenho animado argentino. Após duas décadas como jogador profissional, o volante decidiu interromper sua carreira, aos 37 anos. O camisa 19 vestiu as camisas de Real Madrid, Inter e River Plate – clubes pelos quais construiu um grande currículo, com 25 títulos conquistados em mais de 800 partidas oficiais e 100 gols marcados.

Cambiasso nasceu em Buenos Aires, mas sua trajetória futebolística começou em um clube amador de Córdoba, no centro do país. Aos 15 anos, já de volta à capital, Cuchu ingressou nas categorias de base do Argentinos Juniors juntamente ao irmão mais velho, o goleiro Nicolás, mas pouco ficou no Bicho: ambos acabaram observados e contratados pelo Real Madrid ainda antes dos 18 anos. Se o primogênito logo retornou para o país natal, Esteban seguiu no time reserva merengue por dois anos. Nesse período em que defendeu o Castilla, também foi campeão mundial e sul-americano pela seleção sub-20 da Argentina.

Depois de um ano como protagonista na segunda divisão espanhola, a partir de 1998, o volante ficou três anos emprestado ao Independiente e um ao River Plate. Em todas as quatro temporadas foi titular e destaque do Campeonato Argentino, colecionando mais de 100 presenças e o título do Clausura de 2002 pelos millonarios. Comandado pelo ex-jogador Ramón Díaz (de extensa carreira pelo futebol italiano), Cambiasso fez parte de um grande elenco, que contava com jogadores como Juan Pablo Carrizo, Martín Demichelis, Mario Yepes, Pablo Aimar, Andrés D’Alessandro, Ariel Ortega, Fernando Cavenaghi, Juan Esnáider, Daniel Fonseca e Maxi López.

No River Plate, Cambiasso se estabeleceu como um meio-campista completo. Apesar de jogar na frente da zaga com grande competência defensiva, combinando posicionamento inteligente e desarmes precisos, o volante mostrava muita técnica com a bola e boa capacidade para passar, além de aparecer constantemente na área adversária para finalizar. No último ano em seu país, Cuchu marcou 14 gols em 46 partidas e voltou com moral para o galático Real Madrid.

Ainda com cabelos, Cambiasso explode de alegria em seu primeiro ano em Milão (AFP/Getty)

Mesmo diante da concorrência de Claude Makélélé, Flávio Conceição, Guti, Steve McManaman, Luís Figo, Zinédine Zidane e Santiago Solari, Cambiasso conseguiu bastante espaço com o técnico Vicente del Bosque em seu primeiro ano na capital espanhola. Logo de cara, conquistou o campeonato espanhol de 2003, a Supercopa Uefa e o Mundial Interclubes de 2002, sendo titular nas duas finais ao lado de Makélélé. O argentino fez 40 partidas na temporada e também foi presença constante nos jogos da Liga dos Campeões, competição em que os madrilenhos caíram para a Juventus, na semifinal. Na temporada seguinte, entretanto, perdeu espaço com Carlos Queiroz e acabou saindo ao final do contrato, no verão de 2004. Acabou se transferindo para o país de seus ancestrais, a Itália.

Presença regular nas convocações da seleção argentina, o volante foi contratado pela Inter como agente livre em agosto daquele ano. Em Milão, se uniu a vários compatriotas e colegas de seleção, como o capitão Javier Zanetti (com quem desenvolveu grande amizade desde então), Julio Cruz, Kily González e os também recém-contratados Nicolás Burdisso e Juan Sebastián Verón. Cambiasso acabou sendo um dos grandes nomes do primeiro mercado nerazzurro após a contratação do jovem treinador Roberto Mancini e virou peça-chave do sistema no ano de seus debutes.

Com Mancini, Cuchu foi além e se tornou um dos melhores do mundo em sua posição, além de finalmente assumir a titularidade da seleção nacional, sempre mantendo suas características de volante firme defensivamente e com qualidade no apoio. Somente com Diego Maradona é que não emplacou e, de maneira incrível, foi deixado de fora da Copa do Mundo de 2010 – só disputou mesmo o Mundial anterior, na Alemanha. Na ocasião, perdeu um dos pênaltis que valeram a eliminação da albiceleste nas quartas de final da competição, para a anfitriã.

Cambiasso não deslanchou em Madrid, mas chegou à Inter para se tornar um dos maiores ídolos da torcida (AFP/Getty)

Na Inter, Cambiasso se estabeleceu jogando na frente da defesa nos primeiros anos e depois mais solto pela esquerda, quando começou a marcar mais gols. Com a ajuda do amigo Zanetti, rapidamente se tornou uma das referências do vestiário e um dos grandes ídolos da torcida. Para alcançar este status, foi fundamental a proximidade com o presidente Giacinto Facchetti, eterna bandeira interista que faleceu em 2006 e que foi homenageado pelo argentino na final da Liga dos Campeões de 2010.

Cambiasso foi titular da Beneamata nos dois primeiros anos em Milão e, no período, comemorou duas conquistas da Coppa Italia e um scudetto, depois do escândalo Calciopoli. A única temporada em que Cambiasso sofreu com problemas físicos foi a de 2006-07, quando a equipe bateu o recorde de pontos e conquistou a Serie A com apenas uma derrota e 97 pontos: o camisa 19 participou de apenas um turno do campeonato. Na temporada seguinte voltou ao protagonismo e teve seu ano mais prolífico na Itália, com oito gols anotados.

Em 2008, Cuchu comemoraria o nascimento da sua primogênita Victoria com um triunfo no Derby d’Italia. O segundo filho, Dante, veio em 2013, e dois dias depois o volante marcou contra a Fiorentina. Esteban fez outros gols importantes, como o que decidiu um Derby della Madonnina em 2007 e o que sagrou a vitória da Inter sobre o Chelsea na ida das oitavas de final da Liga dos Campeões de 2009-10. Cambiasso também foi o responsável pelo tento que assegurou a classificação para a fase final da competição no ano seguinte.

Com a camisa 3, que Facchetti vestiu, Cambiasso levanta o troféu da Champions League (AFP/Getty)

Por sua importância tática, liderança e pelos gols marcados, o argentino foi símbolo da geração mais vencedora da história da Inter. Só com a camisa nerazzurra, Cambiasso conquistou 15 títulos (entre Serie A, Liga dos Campeões, Copa do Mundo de Clubes e outros), com 431 partidas e 51 gols marcados. O volante carregou bastante a braçadeira nas ausências de Zanetti e, embora nunca tenha sido o capitão oficial da Inter, se estabeleceu como um dos líderes daquele grupo – era praticamente um segundo treinador dentro de campo. Cuchu assumiu um papel muito importante também em seus três últimos anos no clube, justamente os únicos em que não conquistou troféu algum.

Uma imagem marcante deste período foi de 2012: o choro do argentino ao ser vaiado por parte da torcida quando era substituído contra o Catania. Cambiasso era conhecido por ser uma pessoa equilibrada e serena, mas deixou a emoção tomar conta de si, por sua identificação com as cores do clube. Outro momento que destoou de sua trajetória foi sua única expulsão em uma década na Itália, em 2013: em raro lance de violência, deu uma dura entrada em Sebastian Giovinco, num clássico contra a Juventus, mas se desculpou imediatamente.

Cambiasso deixou a Inter em maio de 2014 e sua saída, ao lado dos compatriotas Zanetti, Walter Samuel e Diego Milito foi bastante criticada à época – mesmo com a promessa de ter um cargo no clube futuramente. O volante até recebeu propostas, mas não quis atuar por outros clubes do Belpaese para não enfrentar “sua” Inter. Com isso, acabou se transferindo para a Inglaterra, para assinar contrato de um ano com o recém-promovido Leicester.

Em algumas das raras vezes em que Zanetti não esteve em campo, Cambiasso vestiu a braçadeira de capitão da Inter (Getty)

O argentino foi decisivo para a permanência do clube na Premier League, em uma campanha dramática, na qual a salvação foi conquistada somente nas últimas rodadas. Cuchu marcou cinco gols ao longo do ano, com destaque para um anotado na virada por 5 a 3 contra o Manchester United. Acabou a temporada eleito como o jogador favorito dos torcedores, porém não seguiu nos Foxes, que ganhariam o título inédito da primeira divisão com Claudio Ranieri no ano seguinte.

Determinado a voltar a jogar a Liga dos Campeões, Cambiasso se mudou para a Grécia, mais precisamente para o Olympiacos. Em dois anos no maior clube do país, conviveu com problemas físicos, mas realizou seu desejo: foi presença constante nos jogos internacionais e adicionou mais duas taças para seu currículo, com a conquista do bicampeonato grego. Nesse período, com mais tempo livre e pela proximidade entre Grécia e Itália, o argentino começou seus estudos no curso de treinadores de Coverciano.

Sem contrato a partir de julho de 2017, Cambiasso decidiu se aposentar somente em setembro, pouco depois de ter sido anunciado como um dos aprovados no curso Uefa A, da escola de treinadores da FIGC. El Cuchu ficou habilitado a treinar times profissionais da terceira divisão, equipes de categorias de base e também a ser auxiliar em clubes da elite. Sua única experiência acabou sendo como assistente de José Pékerman, seu técnico nas seleções de base da Argentina, pela Colômbia, ao longo da Copa de 2018. Depois, o craque se estabeleceu como comentarista.

Esteban Matías Cambiasso Delau
Nascimento: 18 de agosto de 1980, em Buenos Aires, Argentina
Posição: meio-campista
Clubes: Real Madrid Castilla (1996-98), Independiente (1998-2001), River Plate (2001-02), Real Madrid (2002-04), Inter (2004-14), Leicester (2014-15) e Olympiacos (2015-17)
Títulos: Campeonato Sul-Americano Sub-20 (1997 e 1999), Copa do Mundo Sub-20 (1997), Campeonato Argentino (Clausura; 2002), Supercopa Uefa (2002), Copa Intercontinental (2002), La Liga (2003), Supercopa da Espanha (2003), Coppa Italia (2005, 2006, 2010 e 2011), Supercopa Italiana (2005, 2006, 2008 e 2010), Serie A (2006, 2007, 2008, 2009 e 2010), Liga dos Campeões (2010), Mundial de Clubes da Fifa (2010) e Campeonato Grego (2016 e 2017)
Seleção argentina: 52 partidas e 5 gols

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