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Com show de Christian Vieri, a Itália bateu o Equador em estreia na Copa do Mundo de 2002

A Copa do Mundo de 2002 representava, para a Itália, uma oportunidade extraordinária. Na Coreia do Sul e no Japão, a Nazionale teria a chance de, 20 anos após a conquista do tricampeonato, chegar ao quarto título da competição. Considerada como uma das favoritas à taça, ao lado de Brasil, Argentina, França e Inglaterra, a Squadra Azzurra tinha uma geração talentosíssima e um dos técnicos mais vitoriosos da história. A estreia, contra o Equador, foi um doce sonho – mas a participação italiana terminaria de forma amarga.

Na década de 1990, a Itália obteve bons resultados no Mundial, embora tenha sempre batido na trave. Jogando em casa, foi terceira colocada; em 1994, perdeu para o Brasil e foi vice; em 1998, caiu nos pênaltis para a França, anfitriã e futura campeã, nas quartas de final, o que lhe fez concluir a competição na quinta posição. Na Euro 2000, os azzurri amargaram mais um segundo posto por conta do gol de ouro de David Trezeguet, que deu o título aos franceses. Em paralelo aos resultados da seleção principal, a equipe sub-21 dominava o cenário continental: venceu o Europeu da categoria em 1992, 1994, 1996 e 2000.

Sem dúvida, o futebol italiano contava com material humano de dar inveja aos rivais. As gerações que brilharam na categoria sub-21, potencializadas pelo técnico Cesare Madini, pediam passagem na Squadra Azzurra. O próprio ex-zagueiro do Milan utilizou alguns deles em seu trabalho na seleção principal, durante a Copa de 1998, e Dino Zoff fez o mesmo durante a Euro 2000. Atacado duramente por Silvio Berlusconi, ex-primeiro-ministro e presidente do Milan, que ainda tinha ampla influência política, o capitão do tri deixou o cargo e a FIGC, federação nacional do esporte, respondeu de forma taxativa: contratou o veterano Giovanni Trapattoni, treinador mais vitorioso do país.

Ex-técnico de Milan, Juventus, Inter, Bayern Munique, Cagliari e Fiorentina, Trapattoni tinha 19 títulos àquela altura – entre eles, sete scudetti, uma Bundesliga, uma Copa dos Campeões, três Copas Uefa e um Mundial Interclubes. O lendário treinador lombardo foi anunciado em julho de 2000 e construiu uma campanha impecável nas eliminatórias para o maior torneio de seleções do planeta: seis vitórias e dois empates nos oito jogos necessários para a classificação da Itália, que superou um grupo com Romênia, Geórgia, Hungria e Lituânia. As únicas derrotas ocorreram em amistosos – 2 a 1 para a Argentina e 1 a 0 para a Chéquia.

O capitão Maldini foi o líder de um renovado grupo italiano na Copa de 2002, na qual os azzurri estrearam contra o Equador (Getty)

Para chegar a seu quarto título, a Itália precisaria passar por México, Croácia e Equador, seleções sorteadas a seu lado no Grupo G. A lista de convocados de Trap tinha um remanescente da Copa de 1994 (Paolo Maldini, o capitão) e diversos integrantes das vitórias nos Europeus Sub-21, alguns em sua segunda disputa de Mundial, como Gianluigi Buffon, Francesco Toldo, Fabio Cannavaro, Alessandro Nesta, Alessandro Del Piero, Filippo Inzaghi e Christian Vieri. Christian Abbiati, Francesco Coco, Cristiano Zanetti, Gennaro Gattuso, Damiano Tommasi, Francesco Totti e Marco Delvecchio estreavam na competição.

Com jogo baseado na chamada zona mista, Trapattoni preferia que os adversários da Itália tivessem a bola por mais tempo. Assim, atraía os rivais para seu campo e congestionava a entrada da área, obrigando-os a buscarem jogadas pelas laterais. Estabelecida a pressão dos defensores, os azzurri buscavam roubar a pelota e acionar, da forma mais vertical possível, os seus atacantes – frequentemente, através de lançamentos longos. Para isso, o treinador gostava de contar com um centroavante forte fisicamente, como Vieri, e pelo menos uma peça qualificada para o último passe, como Totti.

Foi seguindo esses preceitos que a Squadra Azzurra entrou em campo na sua primeira partida da Copa de 2002, em Sapporo, no norte do Japão, contra o Equador. Desde o início da peleja, a Itália fez valer o seu favoritismo e se aproveitou do nervosismo da seleção sul-americana, que jamais havia disputado a competição. Nem mesmo a presença do veterano Álex Aguinaga, tido como um dos maiores jogadores da história equatoriana, acalmou os outros atletas de La Tri.

No esquema de Trapattoni, Totti era o principal responsável por acionar o centroavante Vieri (Getty)

Vieri, que vinha de grande fase na Inter, dominou a partida desde os seus instantes iniciais. O centroavante aparecia no campo de ataque a todo instante e causava terror na defesa equatoriana. De cara, recebeu um passe em profundidade de Totti e parou em ótima defesa de José Cevallos. Logo aos 7 minutos, a interação entre os dois funcionou de novo: o craque da Roma cruzou rasteiro e Bobo chapou no ângulo, abrindo o placar para a Squadra Azzurra.

O gol prematuro deu ainda mais tranquilidade à equipe de Trapattoni, que colecionou chances criadas nos primeiros minutos de partida – em chutes de longe, Totti e Vieri levaram perigo a Cevallos novamente. Aos 27, a estratégia do treinador italiano funcionou à perfeição: após retomada de bola em campo defensivo, o atacante da Inter recebeu um lançamento preciso de Luigi Di Biagio, seu companheiro de clube, ganhou no corpo de Ulises de la Cruz e escapou em velocidade. Em sua quarta chance em um intervalo curtíssimo de tempo, Bobo não desperdiçou e marcou o segundo dos azzurri, batendo na saída do arqueiro.

As melhores chances do Equador aconteceram com Édison Méndez, pelo lado direito, mas Buffon quase não sujou o uniforme – ao passo que Cevallos continuava a sofrer com as investidas de Totti e Vieri. Os sul-americanos terminaram o primeiro tempo com 59% de posse de bola, mas dois gols de desvantagem. O plano de Trap funcionava.

Dono do jogo, Vieri marcou duas vezes sobre os equatorianos (AFP/Getty)

A seleção do Equador voltou para o segundo tempo disposta a mudar o cenário. O técnico Hernán Gómez chegou a sacar Aguinaga para colocar o centroavante Carlos Tenorio, que passaria pelo Vasco anos depois. La Tri passou a atacar mais, coisa que pouco aconteceu na primeira etapa, mas não ofereceu riscos à defesa italiana, que controlou bem o resultado. Na verdade, a Nazionale ainda chegou a acertar o travessão adversário com Cristiano Doni, após escanteio. Buffon só trabalhou aos 90 minutos, quando fez ótima defesa em chute de Agustín Delgado.

Entre as principais concorrentes ao título, nenhuma seleção estreou melhor do que a Itália. A França foi surpreendida por Senegal (1 a 0), o Brasil precisou virar sobre a Turquia (2 a 1), a Argentina construiu placar magro sobre a Nigéria (1 a o) e a Inglaterra empatou com a Suécia (1 a 1). No grupo das outsiders, Portugal perdeu para os Estados Unidos (3 a 2), enquanto Espanha e Alemanha deixaram boas impressões – com vitórias por 3 a 1 sobre a Eslovênia e 8 a 0 sobre a Arábia Saudita, respectivamente. A cotação da Nazionale subiu, portanto.

Apesar disso, a Itália só jogou bem mesmo na rodada inaugural da Copa de 2002. Depois da vitória na estreia, a equipe de Trapattoni não rendeu à altura de seu potencial e, na fase de grupos, perdeu de virada para a Croácia e sofreu para empatar com o México, de modo que se classificou com a segunda posição da chave. Nas oitavas de final, a Nazionale enfrentou a Coreia do Sul, dona da casa, e, novamente, um “adversário” do Equador: o polêmico árbitro Byron Moreno. Tida como uma das piores arbitragens de um Mundial, a sua atuação é considerada, até hoje, como a principal causa da eliminação da talentosa geração azzurra.

Itália 2-0 Equador

Itália: Buffon; Panucci, Nesta, Cannavaro, Maldini; Zambrotta, Tommasi, Di Biagio (Gattuso), Doni (Di Livio); Totti (Del Piero); Vieri. Técnico: Giovanni Trapattoni.
Equador: Cevallos; De la Cruz, Hurtado, Poroso, Guerrón; Méndez, E. Tenorio (Ayoví), Obregón, Chalá (Asencio); Aguinaga (C. Tenorio); Delgado. Técnico: Hernán Gómez.
Gols: Vieri (7′ e 27′)
Árbitro: Brian Hall (Estados Unidos)
Local e data: Sapporo Dome, Sapporo (Japão), em 3 de junho de 2002

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