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Já veterano, Víctor Muñoz ajudou a Sampdoria a viver sua era dourada

Nascido em Zaragoza, em meados dos anos 1950, Víctor Muñoz se tornou um dos futebolistas aragoneses mais importantes de todos os tempos. O meio-campista fez história no Barcelona, clube pelo qual venceu diversos títulos, disputou Copa do Mundo pela Espanha e, por fim, também participou de um esquadrão imortal da Sampdoria, que conquistou taças na Itália e na Europa no fim da década de 1980.

Víctor, como ficou conhecido no futebol, teve seu primeiro contato com o esporte no colégio, o Boscos de Salesianos. Quando atingiu a maioridade, em 1975, firmou um vínculo com o Zaragoza e foi se desenvolver no Deportivo Aragón, time B dos blanquillos. Na quarta divisão hispânica, Muñoz se destacou fisicamente e logo tomou conta do meio-campo. Com um trabalho defensivo muito apurado, os adversários encontravam muita dificuldade de passar por ele e penetrar na defesa.

Não demorou muito para que essas qualidades chamassem a atenção do time principal. Logo após ajudar a equipe a vencer a Preferente Aragonesa, divisão regional de acesso à terceirona, o baixinho de menos de 1,70 m foi integrado ao elenco do Zaragoza. Muñoz amargou o rebaixamento em 1976-77, sua temporada de estreia, mas ajudou os maños a conquistarem o retorno imediato, com o título da segundona, e a se manterem na elite nas três campanhas seguintes.

Apesar de o Zaragoza rondar as posições de meio de tabela para baixo em La Liga, Muñoz ganhou destaque nacional. Vestiu a camisa 10 da Espanha nos Jogos Olímpicos de 1980 e, no ano seguinte, ganhou as primeiras chances na seleção principal da Fúria. Com esse cartaz, se transferiu para o Barcelona no verão europeu de 1981.

Jogando com a camisa dos culés, Muñoz teve o período mais vitorioso de sua carreira: foram sete títulos conquistados, dentre eles o de La Liga (1985), o da Recopa Uefa (1982) e o da Copa do Rei (1983 e 1988) – também amargou o vice europeu em 1986, na derrota nos pênaltis para o Steaua Bucareste, da Romênia. Talvez a primeira copa nacional tenha um lugar especial em seu coração, pois ele abriu o placar na vitória por 2 a 1 na final realizada ante do maior rival do Barça, o Real Madrid.

Víctor foi titular absoluto do Barcelona durante toda a sua passagem pela Catalunha, de 1981 a 1988, e chegou a utilizar a braçadeira de capitão em algumas ocasiões, na ausência de José Ramón Alexanko. Meia central, capaz de articular jogadas e também pará-las, às vezes era deslocado para atuar pelos flancos. Não era de marcar muitos gols, mas além do tento sobre o Real Madrid citado anteriormente, balançou as redes em três clássicos locais contra o Espanyol. Outra satisfação que o Barça lhe proporcionou foi a de poder atuar ao lado de jogadores como Diego Armando Maradona, em sua primeira experiência na Europa, e a joia alemã Bernd Schuster.

Nos seus tempos de titular absoluto na Catalunha, Muñoz também foi peça central da Espanha: entre 1983 e 1988, foi dono do meio-campo da Fúria, a qual representou em 60 jogos internacionais. Víctor foi convocado para as Eurocopas de 1984 e 1988, sendo vice na primeira ocasião citada – a França bateu os espanhóis por 2 a 0 na decisão. O meia também participou do Mundial do México, em 1986, no qual La Roja caiu nas quartas de final num jogo parelho com a Bélgica. Naquela partida, o atleta do Barcelona contribuiu com uma assistência e converteu a sua cobrança na disputa de pênaltis que selou a eliminação dos ibéricos.

Depois de ser ícone do Barcelona, Muñoz teve passagem pela Sampdoria na fase final de sua carreira (Onze/Icon Sport)

Em seus quase nove anos de clube, Víctor ainda teve tempo de se graduar em Educação Física pelo Instituto Nacional de Educación Física, o INEF. Além de buscar entender melhor todas as questões que envolvem o esporte, ele certamente já estava pensando no futuro, caso quisesse seguir a carreira de treinador.

Depois da Euro 1988, aos 31 anos, Muñoz recebeu uma proposta irrecusável: jogar a Serie A, o principal campeonato nacional da época. Por conta de sua idade, sabia que aquela seria a última chance de rumar para a Itália e, assim, assinou com a Sampdoria. Víctor se tornou o primeiro espanhol a atuar na liga italiana desde a aposentadoria do maestro Luis Suárez, em 1973 – ou seja, 15 temporadas antes.

Muñoz aportou na Ligúria para substituir o alemão Hans-Peter Briegel como segundo estrangeiro da Samp – o outro era o brasileiro Toninho Cerezo – e encontrou um time bastante sólido, com base definida. O técnico Vujadin Boskov estava para iniciar o seu terceiro ano na equipe de Gênova, que ganhara a Coppa Italia na temporada anterior. À sua disposição, o iugoslavo ainda contava com nomes do calibre de Gianluca Pagliuca, Moreno Mannini, Luca Pellegrini, Pietro Vierchowod, Amedeo Carboni, Giuseppe Dossena, Gianluca Vialli e Roberto Mancini.

O espanhol não teve nenhuma dificuldade de se inserir no futebol italiano. A bem da verdade, o único problema que enfrentou foi a falta de calor humano nos jogos em casa, já que o estádio Luigi Ferraris estava sendo reformado para receber a Copa do Mundo de 1990 e a sua capacidade havia sido extremamente reduzida para que as obras andassem. De resto, Víctor se tornou um dos pilares da Sampdoria e disputou 54 das 58 partidas que a equipe fez ao longo de 1988-89 – só Dossena, utilizado em todas elas por Boskov, jogou mais vezes do que o ibérico.

Naquela temporada, a Sampdoria do presidente Paolo Mantovani deu um passo além no seu projeto de elevação a grande força do futebol italiano. A equipe blucerchiata competiu por quatro taças em 1988-89. Faturou apenas uma, novamente a da Coppa Italia, mas mostrou que estava pronta para voos maiores. O quinto lugar na Serie A, o vice na Supercopa Italiana e o segundo lugar na Recopa Uefa eram indicativos de que o caminho era o correto.

Durante a campanha, um incansável Víctor fez dupla com Cerezo no centro do campo doriano, com Dossena ocupando o lado direito e, geralmente, Fausto Pari no flanco oposto da linha de meias do 4-4-2 de Boskov. Muñoz marcou gols sobre Bologna e Lecce na Serie A, com arremates de fora da área e, na Coppa Italia, balançou as redes do Monza – além de ter fornecido uma assistência para Vialli, de cabeça, dar início à vitória por 4 a 0 sobre o Napoli de Maradona na decisão. O espanhol acabou ficando em evidência também na final da Recopa. Afinal, quis o destino que, em Berna, a Sampdoria enfrentasse o Barcelona, antigo clube do meio-campista. Na ocasião, os catalães se impuseram e venceram por 2 a 0.

Apesar de ter entregado um nível bastante alto de performance, Muñoz acabou se vendo no banco de reservas doriano na temporada seguinte. A Sampdoria foi ao mercado e buscou as contratações de Attilio Lombardo e do esloveno Srecko Katanec – este último, contratado após a Federação Italiana de Futebol, a FIGC, ter liberado a possibilidade de cada plantel da Serie A ter até três estrangeiros. Com as chegadas, Boskov reviu seu planejamento tático e entendeu que Víctor tinha de dar espaço aos reforços.

Víctor conquistou dois títulos pela Sampdoria, tendo importância em disputas de copas (imago/Kicker/Liedel)

No fim das contas, Muñoz teve maior utilização durante a metade inicial da temporada 1989-90 e entrou em campo pouquíssimas vezes após a virada do ano. Mesmo assim, adicionou outro título a seu currículo: do banco, assistiu ao triunfo da Sampdoria sobre o Anderlecht na final da Recopa. Com aparições em cinco dos nove jogos dos blucerchiati na competição, deu razoável contribuição na trajetória que resultou na primeira taça internacional da equipe de Gênova.

Sem muito espaço na Samp, Víctor retornou para casa e, castigado por problemas físicos, pouco ajudou na campanha de salvação do Zaragoza em 1990-91: atuou em apenas seis partidas da reta final de La Liga, incluindo a repescagem contra o Murcia, que lutava para disputar a primeira divisão. Após empate por 0 a 0 no sudeste da Espanha, os blanquillos ganharam por 5 a 2 e permaneceram na categoria.

Após sua breve passagem por Aragão, retornou ao futebol internacional. Mas, diante da idade avançada, o meia não teve mercado nas principais ligas europeias: acertou com o St. Mirren, da Escócia. Aos 34 anos, Muñoz chegou para jogar no clube de Paisley, cidade próxima a Glasgow, atuou em apenas 18 partidas, com um gol marcado, e se pendurou as chuteiras antes mesmo de os Saints confirmarem o rebaixamento para a segundona.

Fora dos campos, Muñoz decidiu se valer de sua graduação em Educação Física e a uniu a um curso de formação de treinadores, realizado nos Estados Unidos. Assim, em meados da década de 1990, com o diploma em mãos, assumiu o Mallorca. Víctor logo fez os bermellones brigarem pelo acesso a La Liga e, após bater na trave no primeiro ano, garantiu a promoção no segundo.

Em seguida, o técnico teve uma péssima passagem pelo Logroñés, também na segundona, e se redimiu ao quase levar o pequeno Lleida à elite. Isso lhe rendeu uma experiência no recém-promovido Villarreal, o qual conduziu a um histórico sétimo lugar em 2000-01. Demitido do Submarino Amarelo no início da campanha de 2002-03, Muñoz recebeu uma chance no Zaragoza, seu clube formador. Pelos blanquillos, viveu o seu melhor momento na profissão, levando o time de David Villa e dos brasileiros Sávio e Álvaro aos títulos da Copa do Rei e da Supercopa da Espanha. Víctor também comandou o verde e amarelo Ewerthon e os irmãos Gabriel e Diego Milito nesta passagem pelos maños.

No entanto, apesar do que se podia imaginar, Muñoz não recebeu nenhuma proposta de um clube maior da Espanha depois do sucesso em sua terra natal. O treinador, na verdade, passou a perambular pelo planeta e somou experiências infrutíferas – várias delas, muito curtas: Panathinaikos, Recreativo Huelva, Getafe, Terek Grozny, Neuchâtel Xamax e Sion foram seus empregadores de 2006 a 2013.

Em 2014, Víctor retornou ao Zaragoza. Na ocasião, pegou um time que corria risco de rebaixamento para a terceira divisão e teve a missão de salvá-lo do desastre. Cumprido o objetivo, permaneceu no cargo para a temporada seguinte, mas foi demitido após passar quatro partidas sem vencer. Desde então, nunca mais trabalhou na área, embora não tenha oficializado sua aposentadoria. No fim das contas, sua carreira à beira dos gramados não teve o mesmo sucesso do que aquela que desenvolveu como jogador – na qual defendeu equipes históricas e viveu experiências que poucos conseguiram ter no futebol.

Víctor Muñoz Manrique
Nascimento: 15 de março de 1957, em Zaragoza, Espanha
Posição: meio-campista
Clubes como jogador: Deportivo Aragón (1975-76), Zaragoza (1976-81 e 1990), Barcelona (1981-88), Sampdoria (1988-90) e St. Mirren (1991)
Títulos como jogador: Preferente Aragonesa (1976), Segunda División (1978), Recopa Uefa (1982 e 1990), Copa do Rei (1983 e 1988), Copa da Liga Espanhola (1983 e 1986), Supercopa da Espanha (1983), La Liga (1985) e Coppa Italia (1989)
Clubes como treinador: Mallorca (1996-97), Logroñés (1997), Lleida (1999-2000), Villarreal (2000-02), Zaragoza (2004-06 e 2014), Panathinaikos (2006-07), Recreativo Huelva (2007-08), Getafe (2008-09), Terek Grozny (2010-11), Neuchâtel Xamax (2011-12) e Sion (2012-13)
Títulos como treinador: Copa do Rei (2004) e Supercopa da Espanha (2004)
Seleção espanhola: 60 jogos e 3 gols

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