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O turco-suíço Kubilay Türkyilmaz foi ídolo de um Bologna em profunda crise

Entre o final do outono e o início do verão de 1990, a torcida do Bologna recebeu uma surpresa atrás da outra. Tudo começou em abril, quando o tradicional time rossoblù garantiu uma improvável vaga na Copa Uefa, depois de ter passado boa parte da década de 1980 na segunda e na terceira divisões. Na passagem de uma temporada para a outra, um susto: o atacante Bruno Giordano acabou trocando o clube pelo Ascoli. O escolhido pela diretoria para substituir o artilheiro da boa campanha foi um jovem praticamente desconhecido do grande público, que chegou cercado por alguma desconfiança. Assim começava a trajetória de Kubilay Türkyilmaz pela Itália.

Filho de imigrantes turcos, Kubi nasceu na Suíça, quase na fronteira com a Itália. O cantão de Ticino, de onde ele é originário, fica no sul do país e tem uma enorme comunidade italiana – a língua oficial, aliás, é o suíço-italiano. Türkyilmaz começou no Bellinzona, de sua cidade natal, e seis meses após ser profissionalizado e começar a se destacar na elite do campeonato local, foi convocado pela primeira vez para a seleção suíça. O atacante se sentia mais identificado com a cultura turca, mas como nunca defendeu nenhuma equipe nacional nas categorias de base, aceitou o chamado dos rossocrociati.

Türkyilmaz marcou 46 gols pelos grenás na primeira divisão e recebeu uma oferta do Servette, à época o segundo maior conquistador de títulos helvéticos. Kubi continuou fazendo muitos gols na liga suíça (foram 25) e chamou a atenção de Gino Corioni, que o levou ao Bologna, em outubro de 1990. Cercado pelo ceticismo geral da torcida rossoblù, não obstante tivesse boas marcas no campeonato de seu país e quatro gols pela seleção, o turco-suíço demorou um pouco para se adaptar – ainda que já fosse fluente no idioma local. Kubi estreou apenas na parte final de novembro, na nona rodada da Serie A.

Logo em seu debute, Kubi convenceu o treinador Luigi Radice, recém-chegado à Emília-Romanha, após a demissão de Franco Scoglio. Assim, o suíço ganhou a vaga de titular de uma equipe que tinha vários medalhões, como Antonio Cabrini, Roberto Tricella, Massimo Bonini e Herbert Waas, além do criativo meia Lajos Détári. No comando do ataque, o jogador canhoto marcou seu primeiro tento na Itália num empate suado contra a Atalanta. Valente, Türkyilmaz balançou as redes ainda contra os fortes Parma e Milan: graças a seus tentos, o Bologna conquistou pontos em todas estas partidas.

Aquele Bologna, porém, convivia com inúmeros problemas de lesão no elenco e raramente conseguia repetir o onze inicial. A equipe também não dava sorte e, apesar de conquistar pontos contra algumas equipes do topo da tabela, perdia para concorrentes diretos. Sempre na rabeira do Italiano, o time felsineo ainda se desdobrava com algumas viradas heroicas na Copa Uefa, mas a trajetória acabou interrompida nas quartas de final, contra o Sporting.

A abnegação de Türkyilmaz, que sempre entregava muita garra, senso de posicionamento e qualidade no ataque bolonhês, acabou não sendo suficiente. O suíço marcou nove gols nos 22 jogos realizados pela Serie A, mas não conseguiu evitar o rebaixamento do time, que ficou com a lanterna do campeonato. Embora a disputa de um torneio de segunda divisão pudesse atrapalhar sua evolução como jogador e seus planos de manutenção da titularidade da seleção suíça, Kubi decidiu ficar no Bologna.

No fim da carreira, Kubi teve rápida passagem pelo Brescia (imago)

A Serie B se revelaria um inferno para o Bologna. O presidente Corioni vendeu o clube para adquirir o Brescia (adversário na própria segundona) e as crises financeira e societária se agravaram demais. O elenco, afetado pelos problemas diretivos, não conseguia render. Türkyilmaz até conseguiu marcar 10 gols no campeonato, mas os petroniani flertaram com o rebaixamento e escaparam por apenas um ponto.

No ano seguinte, a situação piorou. O Bologna precisou contar com a bondade do Foggia (que cedeu atletas gratuitamente) para rechear o elenco e deu início aos procedimentos para a falência com a temporada em andamento. A situação caótica nos bastidores influenciava o que acontecia dentro de campo, é claro. Kubi marcou apenas cinco vezes, a equipe teve três treinadores ao longo da temporada e foi rebaixada para a Serie C1. Após a conclusão da temporada, a bancarrota foi anunciada e Türkyilmaz rumou para o Galatasaray.

Na “sua” Turquia, Kubi virou ídolo com uma rapidez invejável. Em outubro de 1993, dois gols marcados em Old Trafford ajudaram o Gala a empatar por 3 a 3 com o Manchester United e, graças ao placar agregado, avançar à fase de grupos da recém-criada Uefa Champions League. Türkyilmaz ajudou os leões a ficarem com o título turco, mas não foi à Copa do Mundo de 1994 com a Suíça por causa de uma grave lesão.

Em 1995, o atacante retornou para o futebol suíço e, por três temporadas, defendeu o Grasshopper, papão de títulos nacionais. No período em que esteve no clube de Zurique, Kubi voltou à seleção. Num jogo das eliminatórias para a Euro 1996, se recusou a entrar em campo contra a Turquia, porque não queria ser considerado um traidor.

Mesmo assim, ajudou a equipe nacional a se classificar para a competição, da qual participou como titular. O único gol da Suíça na competição, marcado na partida inaugural, contra a Inglaterra, em pleno Wembley, teve a assinatura de Türkyilmaz: graças à sua cobrança de pênalti, o jogo ficou empatado por 1 a 1.

Depois de ser bicampeão suíço, Türkyilmaz começou a conviver com problemas físicos, decorrentes de sua lesão dos tempos de Galatasaray. Kubi ainda defendeu Locarno, Luzern e Bellinzona antes de retornar à Itália, novamente contratado por Gino Corioni, no verão de 2000.

No Brescia, as más condições fizeram com que o centroavante não honrasse o número 9 às suas costas. Kubi fez menos de uma dezena de partidas, não marcou gol algum e, em fevereiro de 2001, deixou a Lombardia para acertar com o Lugano. Menos de seis meses depois, decidiu encerrar a carreira, aos 34 anos. Terminava, então, a história do segundo maior artilheiro da seleção da Suíça e do jogador que, entre 1996 e 1998, foi três vezes eleito como o melhor de seu país.

Com exceção de alguns convites para comentar partidas, Türkyilmaz passa quase que inteiramente a sua vida de aposentado em sua cidade natal, onde administra um restaurante. Uma reviravolta, no entanto, aconteceu em 2014, quando o Bellinzona decretou falência e caiu para a sexta divisão suíça. Kubi, que já havia provado no Bologna que gosta de ajudar em situações difíceis, voltou aos campos, com 47 anos: jogando algumas partidas, ajudou os granata a garantirem o acesso para o quinto nível do futebol local. Em 2017-18, a equipe da cidadezinha de apenas 17 mil habitantes está perto de garantir sua vaga na terceirona e tem em Kubi um fiel torcedor.

Kubilay Türkyilmaz
Nascimento: 4 de março de 1967, em Bellinzona, Suíça
Posição: atacante
Clubes: Belinzona (1986-89, 2000 e 2014-15), Servette (1989-90), Bologna (1990-93), Galatasaray (1993-95), Grasshopper (1995-98), Locarno (1998), Luzern (1999), Brescia (2000-01) e Lugano (2001)
Títulos: Campeonato Turco (1994) e Campeonato Suíço (1996 e 1998)
Seleção suíça: 64 jogos e 34 gols

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