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Os asiáticos da Serie A

Asiáticos no futebol italianos não são novidade: alguns jogadores passaram por lá muito antes do indonésio Erick Thohir, presidente da Inter, ou do tailandês Bee Taechaubol, provável novo sócio do Milan – ou até mesmo do chinês Xiaodong Zhu, dono do pequeno Pavia, da terceira divisão.

Apesar de o futebol italiano não ter tanta tradição de acolher asiáticos – na Europa, são os clubes de Inglaterra e Alemanha que mais costumam contratar jogadores do continente –, os primeiros atletas da Ásia aportaram na Velha Bota na década de 1990. Boa parte deles foi contratada muito mais para chamar a atenção do extenso mercado asiático e para incrementar as receitas dos clubes do que por outros motivos, é verdade. O fato é que, de lá para cá, apenas 18 (de oito nacionalidades diferentes) jogaram nas séries A e B, e nem todos com verdadeiro brilho. O país mais representado é o Japão, com 10 futebolistas.

Fizemos um levantamento sobre a passagem destes jogadores pelo futebol italiano e escolhemos 10 deles para contarmos suas histórias, em ordem cronológica, do primeiro que desembarcou na Itália até os que jogam no campeonato ainda hoje. Os asiáticos que atuaram na Itália tiveram muitos problemas de adaptação, em sua maioria, e poucos conseguiram desenvolver seu futebol de maneira digna – alguns viveram até histórias bizarras no Belpaese. Confira abaixo o que o Quattro Tratti conta sobre os orientais da Serie A.

Nota: Neste texto não foram incluídos alguns jogadores de origem asiática, mas com carreira no esporte desenvolvida por outras seleções. Casos de Vikash Dhorasoo, meia de origem indiana que passou por Milan e Livorno e que jogou pela seleção da França, ou de Radja Nainggolan, belga de origem indonésia que atuou por Piacenza e Cagliari, hoje na Roma. Também não consideramos o quarto goleiro da Juventus, Emil Audero, que também tem origem indonésia, mas atua pelas seleções de base da Itália.

Asiáticos na Itália
Japoneses (10):  Kazuyoshi Miura, Hidetoshi Nakata, Hiroshi Nanami, Shunsuke Nakamura, Atsushi Yanagisawa, Masashi Oguro, Mitsuo Ogasawara, Takayuki Morimoto, Yuto Nagatomo e Keisuke Honda
Iranianos (2): Rahman Rezaei e Ali Samereh
Sul-coreanos (1): Ahn Jung-hwan
Iraquianos (1): Ali Adnan
Uzbeques (1): Ilyos Zeytulayev
Chineses (1): Ma Mingyu
Catarianos (1): Montezine*
Sírios (1): George Mourad**

* Brasileiro de nascimento, Montezine se naturalizou e começou a defender o Catar em 2008. Ele atuou apenas na Serie B

** Atuou apenas na Serie B

Kazuyoshi Miura

Posição: atacante
Clubes: Genoa (1994-95)
Títulos: Copa Kirin (1995)

Japonês com toque brasileiro, Kazu Miura se profissionalizou no Juventus da Mooca e atuou em clubes como Santos, Palmeiras, Matsubara, CRB, XV de Jaú, Coritiba e Verdy Kawasaki antes de chegar à Itália. À época ele era considerado o melhor jogador nipônico em atividade e foi contratado pelo Genoa graças à multinacional japonesa Kenwood, que patrocinava os grifoni e pagava um valor extra todas as vezes que o atacante entrava em campo.

Kazu foi o primeiro japonês a atuar na Bota e também foi o primeiro a fazer um gol. Seu único em 21 jogos, aliás: ele se lesionou logo na abertura da temporada, depois de um choque com o milanista Franco Baresi, e retornou no dérbi contra a Sampdoria, anotando um dos gols na derrota por 3 a 2. Na reta final da sua única temporada italiana ele foi representar o Japão na Copa Kirin, que venceu, e acabou não ajudando o Genoa na Serie A. Sua equipe foi rebaixada após spareggio contra o Padova, mas Miura seguiu tendo sucesso pelos Samurais Azuis: com 55 gols, é o segundo maior goleador da história da seleção.

Hidetoshi Nakata

Posição: meia
Clubes: Perugia (1998-00), Roma (2000-01), Parma (2001-04), Bologna (2004) e Fiorentina (2004-05)
Títulos: Serie A (2000-01) e Coppa Italia (2001-02)

Sinônimo de futebol japonês, Nakata foi o jogador que abriu as portas para jogadores asiáticos no mercado europeu. O meia havia jogado os Jogos Olímpicos e a Copa do Mundo pelo Japão, além de ter sido eleito duas vezes o melhor futebolista asiático. Nome melhor não havia para os planos de Luciano Gaucci, ambicioso presidente do Perugia: para internacionalizar o clube ele fez algumas contratações midiáticas, como a de Hide. Só que o nipônico também rendeu em campo, marcando 10 gols na primeira temporada e sendo cedido à Roma em janeiro de 2000.

Nakata era reserva de Francesco Totti na Cidade Eterna, mas não deixou de ser importante em alguns jogos da campanha do scudetto romano, em 2001. Sem muito espaço, ele acabou sendo negociado com o Parma, com o qual ganhou a Coppa Italia, sobre a Juventus – que foi sua vítima preferida nos anos italianos. Depois, o nipônico acabou atuando sem muito sucesso por Bologna e Fiorentina, últimos clubes na Bota. Aos 29 anos e com três Copas do Mundo pela seleção japonesa, anunciou sua aposentadoria.

Hiroshi Nanami

Posição: meia
Clubes: Venezia (1999-00)
Títulos: nenhum

Formado no Júbilo Iwata, o meia esquerda Nanami chegou à Itália com a bênção de Salvatore Schillaci, que foi seu parceiro no clube japonês e aproveitou seus passes para marcar um caminhão de gols. Entusiasmado com o sucesso de Nakata no Perugia, o presidente Maurizio Zamparini, tão midiático quanto Gaucci, fechou o empréstimo do nipônico, que havia atuado na Copa da Ásia de 1996 e também no Mundial de 1998.

Considerado herdeiro de Álvaro Recoba pela habilidade, Nanami foi contratado pelos lagunari com o intuito de fornecer assistências para os companheiros. No entanto, a temporada do japonês pelos leões alados foi abaixo da média: 24 jogos, sendo somente sete completos, e apenas um gol marcado, contra a Udinese, além de pouquíssimas assistências. Na Coppa Italia, foi titular e ajudou os arancioneroverdi a serem semifinalistas, mas o fato é que o Venezia ficou na 16ª posição na Serie A e foi rebaixado. Sem se adaptar ao futebol italiano, Nanami não foi contratado em definitivo após o rebaixamento e voltou ao Júbilo.

Ahn Jung-hwan

Posição: atacante
Clubes: Perugia (2000-02)
Títulos: nenhum

Após o sucesso de Nakata, o presidente Gaucci levou um novo oriental para o Perugia. Em parceria com a montadora sul-coreana Daewoo, que patrocinaria o clube umbro, os grifoni contrataram o atacante Ahn Jung-hwan, que já se destacava no campeonato da Coreia do Sul e na sua seleção. Em duas temporadas, Ahn jogou 30 partidas, só algumas em bom nível. Em quase todas essas partidas ele entrou no segundo tempo, e marcou, no total, cinco gols. Um desempenho abaixo da média para um jogador que já estava na casa dos 25 anos, mas que acabou sendo muito prejudicado pelos bastidores.

Em 2013, dois anos após se aposentar, o sul-coreano deu uma entrevista na qual acusava os companheiros de Perugia de bullying, e apontava o zagueiro e capitão Marco Materazzi como o principal responsável. “Eu não entendia muito bem, mas ele gritava comigo e dizia que eu fedia a alho”, disse. Ahn também declarou que os companheiros de time também não lhe passavam a bola, mesmo se estivesse bem colocado. Para completar, a sua passagem pela Úmbria terminou muito mal: foi dele o gol que eliminou a Itália na prorrogação das oitavas da Copa do Mundo de 2002, em jogo no qual a Squadra Azzurra foi  prejudicada pela arbitragem de Byron Moreno. Após a queda da Nazionale, Gaucci disse que não pagaria mais o salário de alguém que “arruinou o futebol italiano”. No final de tudo, foram o coreano e seus agentes que alegaram dívidas de salários e com o antigo clube de Ahn, o Busan I’Cons, para rescindir o contrato de empréstimo. Ofendido com Gaucci, Ahn nunca mais voltou para a Itália.

Ma Mingyu

Posição: meia
Clubes: Perugia (2000-01)
Títulos: nenhum

Junto com Ahn Jung-hwan, o Perugia contratou o chinês Ma Mingyu como estratégia de marketing. Gaucci oferecia grandes salários para jogadores de países exóticos (futebolisticamente, à época) para chamar atenção. Ma chegou ao Renato Curi já provocando dúvidas: a assessoria de imprensa perugina declarava que ele tinha 28 anos, mas fontes chinesas diziam que o meia canhoto já teria 32. Oficialmente, viria a se saber depois que tinha 30. A expressão envelhecida lhe rendeu o apelido de Nonno rapidamente.

Apesar da camisa 9 que ganhou logo na chegada, o chinês mal pisou em campo com as cores do Perugia. Vestiu a camisa do time umbro somente uma vez: em um amistoso de pré-temporada. Além disso, foi relacionado para uma partida contra a Salernitana, na segunda fase da Coppa Italia. Ma não era convocado pelo técnico Serse Cosmi nem mesmo para ir ao banco. Ia sempre para as tribunas. Na sua breve passagem pelo futebol italiano, o jogador não se integrou com os colegas e sempre ia direto para casa depois dos treinos para ficar com sua esposa. Após o fracasso na Itália, Ma foi o capitão da China na Copa do Mundo de 2002 e deu o primeiro chute a gol da seleção em um Mundial no jogo contra o Brasil. No ano seguinte, pendurou as chuteiras – indicando que sua idade talvez não fosse a divulgada quando chegou em Perugia.

Rahman Rezaei

Posição: zagueiro
Clubes: Perugia (2001-03), Messina (2003-06) e Livorno (2006-08)
Títulos: nenhum

Contratado pelo Perugia em 2001, o zagueirão Rezaei se destacava pelo físico robusto e pela força. O iraniano foi escalado como titular por Serse Cosmi no primeiro ano e chegou a marcar dois gols, mostrando boa presença de área e auxiliando a equipe a ficar na 8ª posição. Em seu segundo ano com a camisa dos grifoni acabou perdendo a posição para Sean Sogliano, mas fez parte do grupo que alcançou o 9º lugar no Italiano e as semifinais da Coppa Italia.

Rezaei foi vendido ao Messina, da Serie B em 2003, e foi na Sicília que viveu sua melhor fase na Itália. Titularíssimo da equipe peloritana, ele contribuiu para a volta à elite e para a conquista de uma histórica 7ª posição, em 2004-05 – foi o maior feito da história dos biancoscudati, e Rezaei foi o jogador que mais atuou na campanha, com 36 jogos. Apelidado de “Tapete Voador” e de “Secretário de Defesa” pela torcida do Messina, o iraniano foi contratado como reforço do Livorno para a disputa da Copa Uefa, em 2006. Já experiente, atuou poucas vezes pelos amaranto e não evitou o rebaixamento da equipe, dois anos depois, época em que deixou a Itália para voltar à Ásia e se aposentar. Pela seleção persa, o jogador atuou nas Copas da Ásia de 2004 (o Irã foi terceiro colocado) e 2007 e na Copa do Mundo de 2006.

Shunsuke Nakamura

Posição: meia
Clubes: Reggina (2002-05)
Títulos: Copa da Ásia (2004)

Nakamura chegou à Itália com 24 anos, depois de ter sido eleito melhor jogador da J-League, pelo Yokohama F. Marinos, e de ter vencido uma Copa da Ásia pelo Japão – mesmo tendo sido excluído do elenco nipônico para o Mundial de 2002. Era apenas a terceira vez que a Reggina jogava uma Serie A e Naka, que ganhou a camisa 10, se tornou fundamental para a permanência da equipe na elite logo na primeira temporada, marcando oito gols – sete no Italiano – e dando algumas assistências. Foi neste ano que o canhoto começou a mostrar para o mundo sua habilidade com a perna canhota, especialmente nas bolas paradas.

O sucesso de Nakamura fez com que a Reggina fosse convidada para um amistoso contra o Yokomaha F. Marinos no Japão. No arquipélago, o clube vendeu mais de 50 mil camisas e ainda conseguiu um novo patrocinador, algo importante para um clube pequeno. Em 2003-04, porém, o meia sofreu com as lesões e não conseguiu ajudar muito a equipe calabresa, que novamente garantiu a permanência na elite. Depois de mais uma temporada de amistosos no Oriente e do título na Copa da Ásia, Nakamura voltou à Calábria para seu último ano na Itália. Os amaranto conseguiram outra salvezza, dessa vez com mais folga, mas o japonês não brilhou muito e acabou deixando a Bota para acertar com o Celtic, clube pelo qual foi ídolo.

Takayuki Morimoto

Posição: atacante
Clubes: Catania (2006-11 e 2012-13) e Novara (2011-12)
Títulos: nenhum

Morimoto é, ainda hoje, o jogador japonês mais jovem a estrear profissionalmente e o mais novo a ter marcado um gol pela J-League, com menos de 16 anos. Com esses feitos, logo chamou a atenção, e o Tokyo Verdy acabou emprestando o atacante para o Catania, na volta dos sicilianos para a Serie A após 22 anos. Ele estreou na reta final da temporada e, com cinco minutos em campo, anotou seu primeiro gol pelo clube etneo, contra a Atalanta. O nipônico acabou rompendo o ligamento do joelho esquerdo, mas mesmo assim foi contratado em definitivo pelo Catania. Em dois anos, acabou jogando pouco.

Conhecido como o “Ronaldo do Sol Nascente” pela explosão precoce e pela aparência, mas também pela velocidade e pelo bom poder de finalização, Morimoto começou a ganhar mais reconhecimento na temporada 2008-09, quando Walter Zenga era o treinador da equipe. Com mais minutos em campo, ele marcou alguns gols importantes, como dois sobre a Roma, além de outros contra Juventus, Napoli e no dérbi regional contra o Palermo. Após sete gols na temporada da quebra do recorde de pontos dos rossoazzurri em suas participações na Serie A, o japonês, então com 21 anos, ganhou o apelido de Maremoto. Em 2009-10 ele ainda teve algum destaque, o que lhe valeu a convocação para a Copa de 2010. Depois, porém, ele não figurou nos planos dos técnicos que passaram pelo Massimino, teve poucas oportunidades e também acabou cedido ao Novara por uma temporada. Sem conseguir evoluir e ser regular após o bom início na Itália, Morimoto voltou ao futebol asiático.

Yuto Nagatomo

Posição: lateral
Clubes: Cesena (2010-11) e Inter (2011-hoje)
Títulos: Coppa Italia (2011) e Copa da Ásia (2011)

Entre todos os asiáticos que passaram pela Serie A, Nagatomo é o que fez carreira mais sólida, com mais de 150 partidas com a camisa de um grande clube. Após ser titular na boa campanha do Japão na Copa de 2010, o lateral ambidestro foi contratado pelo Cesena e foi um dos destaques da posição no primeiro turno da temporada 2010-11, a ponto de ser contratado pela Inter em janeiro. Depois de vencer a Copa da Ásia com os Samurais Azuis, aterrissou em Milão e se tornou uma peça importante do elenco vice-campeão italiano e vencedor da Coppa Italia. A adaptação do lateral, primeiro nipônico da história interista, aconteceu muito por causa de Javier Zanetti, que logo o acolheu e o apadrinhou.

Nos três anos sucessivos, Nagatomo se tornou titular da Beneamata, jogando ora na lateral esquerda, ora na direita, e sempre apoiando muito no ataque, sua principal característica, aliada à resistência física. Sua melhor temporada foi a de 2013-14, na qual marcou cinco gols e acabou até sendo eleito o melhor jogador japonês em atividade no exterior. Respeitado em Milão, Yuto chegou a utilizar a braçadeira de capitão em alguns jogos pelos nerazzurri, ao passo que ganhava importância na seleção de seu país: atuou em todas as competições oficiais disputadas pelo Japão entre 2010 e hoje, e já tem quase 90 jogos pelos samurais. Após perder espaço em 2014-15, Nagatomo voltou a ser mais utilizado nesta temporada.

Keisuke Honda

Posição: meia
Clubes: Milan (2014-hoje)
Títulos: nenhum

Assim como Nagatomo, Honda chamou a atenção dos grandes centros europeus após o Mundial de 2010. Destaque do Japão naquela campanha, o meia-atacante já havia passado pelo VVV-Venlo, da Holanda, e estava no CSKA Moscou, da Rússia. Após bons anos pelo Exército Vermelho, o Milan decidiu investir em sua contratação, em janeiro de 2014. Canhoto habilidoso e com ótimo poder de finalização de fora da área e em bolas paradas, o japonês recebeu a camisa 10 e se esperava que pudesse ajudar os rossoneri na busca por dias melhores. Até agora, Honda teve apenas alguns lampejos e muitas atuações abaixo da média.

O Milan vem passando por uma reformulação grande nos últimos anos e a pressão é muito grande em Milanello, é verdade. Porém, se esperava que o Honda que chegou ao Diavolo fosse ao menos semelhante àquele que encantou no CSKA e na seleção japonesa, mas não tem passado perto disso. Apesar de, em 2016, ter feito alguns jogos de qualidade superior ao que vinha apresentando, a torcida ainda aguarda melhores atuações do jogador de quase 30 anos. Até o momento, Honda tem 72 jogos e 10 gols pelo Milan.

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