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Corações ingratos: os jogadores que defenderam os rivais Inter e Juventus

A enorme rivalidade entre Inter e Juventus tem um componente único na Itália: é uma disputa pela hegemonia do futebol do país, mas não fica restrita a isso. O duelo mexe com toda a península, pois envolve as maiores torcidas do Belpaese, e isso tem consequências supraesportivas, dando abertura a uma guerra de interesses que atravessa diversos campos da sociedade italiana. Falamos sobre estes elementos aqui.

Neste contexto de forte antagonismo entre os clubes, porém, sempre houve espaço para a razão, sobretudo se ela tiver de ser usada para a solução de assuntos econômicos – afinal, Turim e Milão são dois dos polos industriais mais sofisticados da Itália e não pega muito bem não ter tino para os negócios por lá. Alfinetadas, polêmicas de jogo e até mesmo ressentimentos por condutas inapropriadas nunca impediram que as diretorias sentassem para conversar quando poderia haver ganho mútuo. Portanto, não é de surpreender que mais de 75 jogadores tenham atuado pelas duas gigantes.

Vários desses atletas, inclusive, passaram de um lado a outro em acordos feitos entre as cartolagens adversárias. O primeiro que teve a honra de vestir as duas camisas, inclusive, o fez através deste modelo de tratativa: falamos de Angelo Balbiani, que trocou a Juve pela Inter, em 1910. O último deles é um dos três brasileiros que foram profissionais (ou ingratos?) o suficiente para aceitarem virar a casaca: Hernanes, que foi vendido pelos nerazzurri aos bianconeri em 2016.

Vale lembrar que Kwadwo Asamoah e João Cancelo não entram nesta conta particular, já que Juve e Inter, respectivamente, não puderam exercer influência na decisão dos jogadores: com vínculo temporário ou prestes a expirar, não tinham direito a voz nas situações. O ganês acertou com a Beneamata pois se tornara agente livre e o português retornou de empréstimo para o Valencia, que o cedeu à Velha Senhora.

Estas trocas revelam, também, ases e asnos do mercado de transferências de atletas. Há casos de benefício mútuo, como nas operações que envolveram, décadas atrás, Pietro Anastasi e Roberto Boninsegna ou  Marco Tardelli e Aldo Serena. Por outro lado, há registros de erros crassos de avaliação: o que dizer, por exemplo, da liberação de Fabio Cannavaro à Juve sem compensação financeira, apenas com a inclusão de Fabián Carini como contrapeso, aceita pela gestão de Massimo Moratti? Ou do escambo que envolveria Fredy Guarín e Mirko Vucinic e teve de ser abortado depois que a torcida da Inter contestou pesadamente a diretoria, a ponto de cercar o hotel em que os empresários e os cartolas conversavam? São casos que entraram para o folclore da Serie A e acrescentam mais fogo ao duelo.

Assim como no texto sobre os traíras de Inter e Milan, excluímos da nossa lista um seletíssimo grupo: o dos 11 atletas que jogaram pelos três expoentes do futebol italiano, sobre os quais falamos em outro momento (leia aqui). Feita a ressalva, confira a relação dos 15 futebolistas mais representativos que atuaram pelas protagonistas do Derby d’Italia. No final do texto, elencamos todos os “ingratos”.

Angelo Peruzzi

Posição: goleiro
Trajetória nos clubes: 301 jogos pela Juventus (1991-99) e 38 pela Inter (1999-2000)

Ingratidão, aqui me tens de regresso. O tetracampeão mundial Peruzzi apareceu anteriormente na nossa série, no texto sobre os traíras de Lazio e Roma, e concede seu bis. O robusto goleiro, que recebeu o apelido de Cinghialone (javali, em português), começou bem no lado aurirrubro da Cidade Eterna e se destacou num empréstimo ao Verona, mas foi flagrado num exame antidoping por uso de um inibidor de apetite proibido. A Juventus apostou no lacial mesmo assim e colheu frutos: após um ano de adaptação, como reserva de Stefano Tacconi, Peruzzi marcou época no Delle Alpi. A agremiação de Turim foi aquela que defendeu por mais tempo (oito anos) e em que viveu seus melhores momentos.

Titular absoluto entre 1992 e 1999, Peruzzi venceu uma Champions League como protagonista: pegou dois pênaltis contra o Ajax, na final de 1996. Com o forte time de Marcello Lippi, o arqueiro ainda foi tricampeão italiano, levantou um Mundial Interclubes, uma Coppa Italia e foi duas vezes vice europeu – antes da chegada do treinador, ainda conquistara a Copa Uefa. O auge do camisa 1, no entanto, não se estendeu à seleção, principalmente pelas lesões. Campeão de tudo no Piemonte, o arqueiro constatou que precisava de novos estímulos. Assim, após a Juve aceitar oferta de 28 bilhões de velhas liras, o goleiro seguiu Lippi e assinou com a Inter. A passagem por Milão foi breve e durou pouco por sua vontade. Depois de se estabelecer como um dos pontos de força de um time inconstante, que tinha possibilidades de ir além de um quarto lugar no Italiano e do vice na copa, Angelo decidiu mudar de ares novamente. A vontade de ficar mais próximo da família – originária de Blera, nas cercanias de Roma – contribuiu para que a Lazio investisse no futuro ídolo da torcida.

Giuliano Sarti

Posição: goleiro
Trajetória nos clubes: 198 jogos pela Inter (1963-68) e 10 pela Juventus (1968-69)

O apelido de “goleiro de gelo” e a “ingratidão” de Giuliano Sarti certamente têm a mesma origem: seu pragmatismo. Sóbrio e nada espetaculoso, o emiliano foi considerado como um dos principais nomes da posição nos anos 1950 e 1960, época em que os arqueiros ainda nem utilizavam luvas. Sarti passou a ser conhecido pelo grande público na Fiorentina: foi o titular do time que faturou o primeiro scudetto violeta e o primeiro título Uefa (a Recopa), além de alcançar a final da Copa das Campeões. Na Inter, também foi pilar de conquistas marcantes.

A Grande Inter de Helenio Herrera se destacava por sua defesa fortíssima e pelo aperfeiçoamento do catenaccio. Sarti foi o “Hombre de la Revolución” de HH e encabeçou o sistema defensivo que contribuiu de forma decisiva para os bicampeonatos da Serie A, da Copa dos Campeões e do Mundial Interclubes. No penúltimo ano em Milão, o nerazzurro teve participações opostas em dois vices: enquanto brilhou na derrota contra o Celtic, na final europeia, cometeu um erro crasso no 1 a 0 diante do Mantova, na derradeira rodada, e foi fundamental para que o scudetto acabasse entregue de bandeja para a Juve. A rival da Beneamata seria seu destino em 1968. Aos 35 anos, Sarti foi reserva de Roberto Anzolin e defendeu seu último clube profissional – na temporada seguinte, se aposentou pela amadora Unione Valdinievole.

Fabio Cannavaro

Posição: zagueiro
Trajetória nos clubes: 74 jogos pela Inter (2002-04) e 128 pela Juventus (2004-06 e 2009-10)

Único zagueiro a conquistar o prêmio de Melhor do Mundo da Fifa até hoje, Fabio Cannavaro só teve a oportunidade de vestir camisas de gigantes do meio para o final da carreira. Revelado pelo Napoli e com grande passagem pelo Parma, o capitão do tetra italiano foi adquirido pela Inter quando já tinha quase 29 anos. A transferência, que tinha o potencial de estabelecer o defensor campano como um dos melhores da Europa naquele momento, não deu nada certo. Para começar, Héctor Cúper decidiu utilizá-lo frequentemente como lateral-direito e a improvisação, obviamente, condicionou o seu desempenho – ainda que a Beneamata tenha sido vice-campeã italiana e semifinalista da UCL. Em meados da segunda temporada em Milão, a queda do argentino em favor de Alberto Zaccheroni fez Cannavaro retornar à sua função de origem, mas o jogador foi vítima de frequentes problemas físicos e não rendeu tão bem.

Em 2004, então, Inter e Juventus protagonizaram um dos negócios mais esdrúxulos da história: a troca simples de Cannavaro pelo goleiro Fabián Carini. Enquanto o uruguaio mal entrou em campo pelos milaneses, o italiano não só recuperou a boa forma como atingiu seu auge em Turim. Ao lado de Lilian Thuram, formou uma dupla quase intransponível e vital para o funcionamento da filosofia pragmática de Fabio Capello. A Velha Senhora dominou amplamente o futebol do Belpaese naquele biênio, mas teve seus títulos cassados após a explosão do Calciopoli. Menos de uma semana depois de levantar o troféu de campeão mundial pela Itália, Cannavaro se tornava um jogador de segunda divisão: por envolvimento no escândalo, a Juve havia sido punida com o rebaixamento. O zagueiro pediu para sair e, sob protestos da torcida, acertou com o Real Madrid. Fabio retornou a Vinovo depois de três anos de altos e baixos em Chamartín, mas o tempo não curou as feridas da tifoseria. Frequentemente criticado pela torcida, colecionou erros e foi um dos piores jogadores na campanha do sétimo lugar na Serie A 2009-10. Acabou não tendo o contrato renovado e foi se aposentar no “mundo árabe”.

Tarcisio Burgnich

Posição: zagueiro
Trajetória nos clubes: 16 jogos pela Juventus (1960-61) e 475 pela Inter (1962-74)

Aqueles que gostam de assistir jogos históricos do passado ou pelo menos conferir suas fichas técnicas podem se recordar de Burgnich em dois deles. O italiano de origens austríacas marcou um dos gols na chamada Partida do Século, o 4 a 3 aplicado pela Itália sobre a Alemanha Ocidental na Copa de 1970, e marcou Pelé na final daquele Mundial. Naqueles tempos, o zagueiro já era chamado de “A Rocha” e era uma bandeira da Inter, mas muito antes havia passado pela Juventus. Formado pela Udinese, Tarcisio chamou a atenção ainda jovem e, aos 21 anos, acertou com a gigante piemontesa. Burgnich fez parte da campanha do scudetto em 1960-61, mas não se adaptou ao esquema tático do time. Dispensado, acabou parando no Palermo.

vendetta sobre a Velha Senhora veio rapidamente. Burgnich marcou um dos gols do 4-2 siciliano em pleno Piemonte e ainda colaborou para que os rosanero concluíssem o campeonato à frente dos bianconeri – respectivamente, as equipes ficaram na 8ª e na 12ª colocações. O friulano foi “premiado” com uma transferência para a Inter de Herrera e, em San Siro, se consolidou como um zagueiro sério, viril e incansável na marcação. Em 12 anos como titular absoluto da Beneamata – 11 deles ocupando o mesmo posto na Nazionale –, Burgnich foi multicampeão, mas não só. O defensor faturou quatro scudetti, duas Copas dos Campeões e dois Mundiais Interclubes, porém contribuiu sobretudo para moldar a identidade e a filosofia de futebol dos nerazzurri.

Lúcio

Posição: zagueiro
Trajetória nos clubes: 136 jogos pela Inter (2009-12) e 4 pela Juventus (2012)

Pentacampeão mundial com a Seleção, Lúcio é um dos três brasileiros que vestiram as camisas dos dois protagonistas do Derby d’Italia. O xerife da zaga, raçudo como poucos, porém, viveu experiências completamente opostas em Milão e Turim. Na Inter, o brasiliense foi fundamental e marcou época numa das principais equipes já formadas pelos nerazzurri, enquanto poucos se lembram até mesmo de tê-lo visto em campo com a camisa da Juventus. Ambas as passagens aconteceram no ápice de sua maturidade. Afinal, Lúcio chegou ao futebol italiano com 31 anos, quando já tinha uma Copa do Mundo no currículo e lugar reservado na galeria de ídolos de Internacional, Bayer Leverkusen e Bayern de Munique. Para o polêmico Louis van Gaal, no entanto, a experiência e a qualidade do defensor não eram mais úteis para os bávaros.

Melhor para a Inter, que contratou o brasileiro por uma pechincha e pode montar uma das linhas defensivas mais celebradas de sua história. Sem a dupla Lúcio-Walter Samuel, dificilmente José Mourinho conseguiria implementar seu modelo de defesa baixa e espaços reduzidos, que limitou o poderio de Chelsea, Barcelona e Bayern, possibilitando à Beneamata a conquista da singular Tríplice Coroa. A complementaridade de estilos entre os jogadores ainda resultou em dois títulos (Mundial Interclubes e Coppa Italia), mas a Inter começou a se desorganizar a partir da partida de Mou. Em 2012, a diretoria começou a renovar o elenco e se desfazer de atletas experientes e de altos salários. Assim, Lúcio rescindiu seu vínculo e assinou gratuitamente com a Juve, então campeã nacional. A transferência decepcionou parte da torcida interista, mas o brasiliense acabou “perdoado” pelo fato de quase não ter entrado em campo pela rival. Fora de forma e dos planos de Antonio Conte, fez apenas 307 minutos vestindo bianconero e, em dezembro, retornou ao Brasil.

Fabio Grosso

Posição: lateral-esquerdo
Trajetória nos clubes: 35 jogos pela Inter (2006-07) e 59 pela Juventus (2009-12)

A carreira de Grosso é uma das mais peculiares do futebol italiano – quiçá, mundial. Herói do tetra azzurro, o lateral-esquerdo teve seus melhores momentos com a camisa dos pequenos/médios Perugia e Palermo, além de uma passagem regular pelo Lyon, da França. Quando teve oportunidade de defender duas das maiores equipes da Europa, no entanto, deixou a desejar: tem dois scudetti em seu currículo, mas pouco colaborou nas campanhas que resultaram em suas conquistas.

O jogador romano foi adquirido pela Inter em 2006, após fazer bela Serie A com o Palermo e, na Alemanha, marcar gol decisivo nas semifinais e converter o pênalti que selou o título mundial da Itália. Grosso aportou em Milão após o Calciopoli e, devido à projetada superioridade da Beneamata sobre as rivais, tinha tudo para deslanchar. No entanto, sofreu com problemas físicos e técnicos, ficando para trás na concorrência com Maxwell e Javier Zanetti. O canhoto foi negociado com o Lyon e, três anos depois, assinou com uma Juve que buscava se reerguer. A emenda saiu pior do que o soneto: Fabio integrou um elenco que obteve dois sétimos lugares seguidos, em 2009-10 e 2010-11, numa das piores fases da história juventina. Grosso teve divergências com a diretoria e foi afastado do elenco no ano da redenção assinada por Conte – o lateral foi o único atleta que não compareceu à festa do título no Stadium, por exemplo. Depois de se aposentar, reatou com os cartolas e comandou o time sub-19 bianconero.

Kwadwo Asamoah

Posição: lateral-esquerdo e meio-campista
Trajetória nos clubes: 156 partidas pela Juventus (2012-18) e 16 pela Inter (2018-atual)

Os elencos 2018-19 de Inter e Juventus contam com quatro corações ingratos, mais precisamente dois para cada lado: Antonio Candreva, João Cancelo, Leonardo Bonucci e Kwadwo Asamoah. Desconsiderando Leo – pelo passado milanista, como explicamos na introdução –, Kojo é, de longe, o mais bem-sucedido do grupo. Afinal, o versátil atleta ganês é o jogador africano que mais conquistou taças no futebol italiano: pela Velha Senhora, comemorou seis scudetti, quatro Copas da Itália e mais três Supercopas nacionais. A marca de 13 títulos dificilmente será superada por outro atleta de seu continente.

Asamoah foi contratado pela Juve após anos positivos como meia central da Udinese. Em Turim, foi reposicionado por Antonio Conte e Massimiliano Allegri como ala canhoto e, depois, até mesmo como um puro lateral pelo mesmo flanco. Resistente, veloz, habilidoso e cuidadoso tanto na fase ofensiva quanto na defensiva, Kojo conquistou a torcida juventina por sua dedicação. Se entre 2014 e 2016 pouco atuou, por causa de uma grave lesão no joelho, nos outros quatro anos no Piemonte foi uma peça importante do elenco. Sua melhor temporada (não por acaso) foi a de 2013-14, na qual a Juve chegou ao recorde de pontos na Serie A (102). Em 2018, o ganês deixou a Velha Senhora em fim de contrato e acertou com a Inter, que o atraiu com as promessas de titularidade garantida e alto salário. Asamoah se adaptou rapidamente ao novo clube e, correspondendo às expectativas, tem sido absoluto na lateral.

Paulo Sousa

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 79 partidas pela Juventus (1994-96) e 40 pela Inter (1998-2000)

O volante Paulo Sousa já chegou à Itália carregando a pecha de traidor: afinal, em 1993, o integrante de uma geração dourada do futebol português protagonizou uma polêmica transferência do Benfica para o Sporting. Suas ótimas atuações pelos clubes lisboetas fizeram com que Luciano Moggi decidisse fazer do meia um dos seus primeiros reforços de sua gestão como diretor esportivo da Juventus. O faro do cartola estava calibrado: na temporada de debute na Itália, o jogador de 24 anos não teve problemas de se adaptar e foi a constante de um meio-campo cujas variáveis eram Antonio Conte, Angelo Di Livio, Didier Deschamps, Alessio Tacchinardi e Giancarlo Marocchi. Em 1994-95, a Velha Senhora faturou a dobradinha nacional e foi vice da Copa Uefa.

No ano seguinte, o impacto de Paulo Sousa na equipe do Delle Alpi foi inferior: até as comparações feitas entre o seu futebol e o de Paulo Roberto Falcão, comuns anteriormente, foram cessando. Pequenas e crônicas lesões no seu joelho, tratadas de maneira incorreta, começariam a atrapalhar seu rendimento dali em diante. Mesmo assim, ele foi bicampeão da Champions League: em 1996, pela Juventus e, na temporada posterior, já no Borussia Dortmund, derrotou sua antiga equipe na decisão. Somente Sousa, Marcel Desailly, Gerard Piqué e Samuel Eto’o conseguiram levantar a orelhuda de forma consecutiva por times diferentes. Em janeiro de 1998, o volante retornou à Itália graças à Inter e até teve uma participação razoável na reta final da campanha do segundo lugar na Serie A. Foi seu canto do cisne: o português ainda ficou mais um ano e meio em Milão, mas viu seu tempo de jogo diminuir cada vez mais, até pendurar as chuteiras antes de completar 32 anos. Antes disso, Paulo Sousa perambulou por Parma, Panathinaikos e Espanyol e defendeu a Seleção das Quinas numa Eurocopa e num Mundial.

Giovanni Ferrari

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 193 partidas pela Juventus (1930-35 e 1941-42) e 125 pela Inter (1935-40)

Craque pouco conhecido fora da Itália, Ferrari tem um dos currículos mais invejáveis de toda a história do futebol do Belpaese. O meia central de ótima presença ofensiva foi um dos principais atletas a executar o ofício de mezz’ala e, por décadas, foi um dos líderes no número de scudetti conquistados: seus oito títulos só foram superados por Gigi Buffon, em 2018. O jogadoraço das antigas também é um dos cinco únicos que foram capazes de ganhar a Serie A por três equipes diferentes, ao lado de Sergio Gori, Pietro Fanna, Aldo Serena e Attilio Lombardo – não é coincidência que apenas o último citado não tenha atuado tanto por Inter quanto Juve. Para concluir, só ele e Cesare Maldini representaram a Itália em Copas do Mundo nas funções de jogador e treinador. Ferrari, no entanto, foi bicampeão com a Squadra Azzurra, em 1934 e 1938.

Revelado pelo Alessandria, o meia passou pelo Internaples antes de assinar com a Juve, em 1930, quando ainda tinha 22 anos. O craque mostrou personalidade e chegou para ser titular numa das equipes mais fortes da Velha Senhora: a que definiu o período chamado de Quinquennio d’oro e se tornou a primeira pentacampeã da história. Um feito igualado apenas por Torino, nos anos 1940, e Inter, nos 2000, e superado pela implacável Juve dos nossos tempos. Autor de 68 gols nesta série, Ferrari foi um dos grandes nomes daquele esquadrão, que contava ainda com Gianpiero Combi, Virginio Rosetta, Umberto Caligaris, Felice Borel e os oriundi Luis Monti, Renato Cesarini e Raimundo Orsi – só Cesarini não esteve no elenco italiano na Copa de 1934. Depois do penta, a tragédia que matou o presidente Edoardo Agnelli mudou os rumos na diretoria bianconera e a Inter conseguiu realizar um sonho: reunir Ferrari e Giuseppe Meazza, parceiros de Nazionale. A dupla funcionou a contento e, além de dar dois scudetti à Beneamata, conduziu os azzurri ao bicampeonato mundial. Após deixar Milão, já veterano, Ferrari ganhou seu último título italiano com o Bologna e retornou ao Piemonte para se aposentar com a camisa juventina.

Marco Tardelli

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 379 partidas pela Juventus (1975-85) e 71 pela Inter (1985-87)

Às vezes bandeiras nascem de onde pouco se espera. Aconteceu com Tardelli, que não cresceu no seio da Juventus, mas se tornou um dos jogadores mais identificados com o clube de Turim. Nascido na Toscana, Marco foi revelado pelo Pisa e ainda passou pelo Como antes de assinar com a Juve, aos 21 anos. Sob as ordens de Giovanni Trapattoni, teve uma evolução rápida e se tornou um dos mais importantes jogadores da história bianconera. Utilizado inicialmente como lateral-esquerdo, Tardelli foi transformado em um dinâmico e habilidoso meia central – que hoje poderia ser definido como um box to box, pelos anglófonos – e logo virou homem de confiança de Trap e pilar da seleção italiana de Enzo Bearzot.

Quando Tardelli viveu seu auge em Turim, dizia-se que ele “desenhava” as jogadas em campo. Além da classe, foi um vencedor, e habitualmente aparecia para decidir – que o diga o gol na final do Mundial de 1982. O toscano conquistou cinco vezes a Serie A com a camisa da Juventus e ainda entrou para a história ao se tornar um dos nove únicos atletas que venceram as três maiores competições de clubes da Europa – Copa dos Campeões, Copa Uefa e Recopa. O acumulador de marcas ainda conseguiu um feito raro: deixou o Piemonte para acertar com a Inter (num negócio em que Aldo Serena fez o caminho inverso) e não foi hostilizado por nenhuma das torcidas. Ícone da Velha Senhora, o meia defendeu a Beneamata entre os 31 e os 33 anos e foi utilizado principalmente em jogos dos nerazzurri na Copa Uefa: em uma das campanhas, marcou dois gols contra o Real Madrid nas semifinais, mas não impediu a eliminação frente aos blancos. Tardelli também chegou a ser técnico da Inter, em 2000-01.

Hernanes

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 52 partidas pela Inter (2014-15) e 35 pela Juventus (2015-17)

Sem dúvidas, Hernanes foi um dos brasileiros mais regulares e de maior sucesso no futebol italiano na década de 2010. A frequência das ótimas exibições do pernambucano pela Lazio muitas vezes suscitou questionamentos: o Profeta não teria lugar em equipes com ambições maiores? O carismático jogador conseguiu este espaço, mas talvez tarde demais. Quando foi adquirido pela Inter, em janeiro de 2014, o grande ídolo celeste não estava apresentando o mesmo futebol que demonstrara no caminho para o título da Coppa Italia do ano anterior e nas ótimas campanhas dos laziali na Serie A.

Em Milão, o meia viveu de lampejos, tentando resistir à desorganização tática dos primeiros meses na equipe e ao futebol engessado do time de Roberto Mancini, na temporada seguinte. Entre os bons momentos, destacam-se gols importantes contra Napoli, Roma e Lazio – todos decisivos para pontos que garantiram a quarta posição da Inter e a classificação à Liga Europa. Em agosto de 2015, passou à Juventus, que o via como peça para rodar o elenco: Hernanes jogava quando Sami Khedira e Claudio Marchisio (depois, Miralem Pjanic) precisavam descansar. Coadjuvante em Turim, pode finalmente viver a emoção de disputar um jogo de Champions League, conquistou seu único scudetto e mais uma copa. Em fevereiro de 2017, rumou ao futebol chinês.

Pietro Fanna

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 141 partidas pela Juventus (1977-82) e 142 pela Inter (1985-89)

Já citado anteriormente como um dos poucos a ter sido campeão italiano por três diferentes equipes, o habilidoso ponta-direita Fanna comemorou títulos por Juventus e Inter. No entanto, é idolatrado mesmo pela torcida do Verona, já que foi o cérebro da fantástica campanha do scudetto do Hellas, em 1984-85. Pierino não era um craque, mas foi importante e teve sucesso por onde passou, inclusive pelos gigantes do Piemonte e da Lombardia.

Fanna foi revelado pela Atalanta e após estrear precocemente pelo time principal bergamasco, foi adquirido pela Juve aos 19 anos. Nos primeiro anos, Pierino teve dificuldades de se adaptar. Muitas vezes atuou fora de posição (como segundo atacante) e, por causa de sua introversão, também não soube lidar bem com a habitual pressão que ronda os times grandes. Entre 1981 e 1982, melhorou seu desempenho, teve boa participação para dois títulos juventinos e acabou se tornando reforço de luxo para um emergente Verona. Em três anos pelos butei, Fanna perdeu os cabelos, ganhou chances na seleção e, com mais um “tricolor” no peito, topou voltar aos grandes palcos ao assinar com a Inter. O ala destro cumpriu seu papel pelos nerazzurri, mas o time de Milão não chegou a ser brilhante de 1985 a 1988. No último ano em San Siro, o carequinha perdeu a titularidade, mas voltou a sorrir: contribuiu com o scudetto dos recordes e entrou para a história da Serie A. Depois disso, retornou ao Hellas e se aposentou pelo clube vêneto, aos 35 anos.

Franco Causio

Posição: meio-campista
Trajetória nos clubes: 452 partidas pela Juventus (1966-68 e 1970-81) e 41 pela Inter (1984-85)

Jogar em alto nível por quase 20 anos é para poucos. Para os jogadores mais habilidosos, com mais inteligência e elegância, como Causio, fica mais fácil. Chamado de Barone – pela classe – e de Brazil – pela técnica –, o ala foi um dos principais coadjuvantes de luxo da história do futebol italiano. Foi nessa condição que se tornou bandeira de uma Juventus absolutamente vitoriosa e, veteraníssimo, ainda foi útil na Inter. Sem falar, é claro, que Franco também integrou o elenco da seleção italiana campeã mundial em 1982 e foi o principal parceiro de Zico na Udinese.

Habilidoso e preciso, Causio foi notado desde cedo pela Juventus: quando foi contratado, aos 17 anos, já acumulava partidas como profissional por Lecce e Sambenedettese. Após ganhar experiência no sul da Bota, com Reggina e Palermo, retornou ao Piemonte para virar lenda. O país louvava Pietro Anastasi, José Altafini, Gaetano Scirea, Dino Zoff e Roberto Bettega, mas muitas vezes era o Barone que decidia a favor da Velha Senhora – com gols ou assistências açucaradas. Em Turim, o apuliano conquistou seis scudetti, uma Copa Uefa e uma Coppa Italia. Após um triênio em Údine, Causio foi uma contratação inteligente e a baixo custo de uma Inter que havia investido alto para acertar com Liam Brady e Karl-Heinz Rummenigge. O bigodudo foi peça útil para os nerazzurri de Ilario Castagner e marcou gols importantes na Copa Uefa, diante de Rangers e Köln. Apesar disso, não foi capaz de evitar a queda nas semifinais. Aos 36 anos, deixou a Lombardia e só se aposentou às vésperas de se tornar um quarentão.

Alessandro Altobelli

Posição: atacante
Trajetória nos clubes: 468 partidas pela Inter (1977-88) e 34 pela Juventus (1988-89)

Conhecido como Spillo (alfinete, em italiano) devido ao porte físico, Altobelli tem uma marca expressiva em sua carreira: por larga margem, é o maior artilheiro da história da Coppa Italia, com 56 gols. O magrão chegou à Serie A aos 22 anos, contratado pela Inter, depois de boas temporadas com as camisas de Latina e Brescia. O atacante canhoto era daqueles especialistas em finalizações e se destacava no jogo aéreo, mas não só. Avante completo, também era hábil com a perna direita, se movimentava muito e tinha uma capacidade notável de segurar a posse de bola e trabalhar em prol dos companheiros.

Altobelli passou 11 anos na Inter, seu time de coração, e se tornou um ícone do clube, principalmente pelas marcas individuais. É um dos 10 jogadores com mais partidas pelos nerazzurri (466) e o segundo maior goleador da Beneamata, com 209 tentos. Além de tudo, foi capitão por três temporadas e se sagrou tricampeão mundial pela Itália enquanto defendia o time milanês. Apesar disso, não pode levantar muitas taças pelo clube da Lombardia: só faturou um scudetto e duas copas locais. Em 1988, por causa de divergências com Trapattoni, o veterano deixou a Inter e acertou com a Juventus, mas não emplacou em Turim. Vitimado por lesões, Spillo não conseguiu jogar bem – na verdade, toda a equipe ficou devendo. Uma temporada depois, o bomber rumou ao Brescia e se aposentou depois de disputar a segundona.

Roberto Boninsegna

Posição: atacante
Trajetória nos clubes: 287 partidas pela Inter (1969-76) e 94 pela Juventus (1976-79)

Um dos maiores artilheiros da história do Derby d’Italia é um coração ingrato. Roberto Boninsegna tem 12 tentos no clássico, assim como Giuseppe Meazza e Omar Sívori, mas é o único do trio que balançou as redes usando as duas camisas: foram nove com a nerazzurra e três com a bianconera. Segnare, em italiano, quer dizer marcar – inclusive gols – e Bonimba fez jus a seu sobrenome: afinal, é um dos 20 atacantes mais prolíficos da história da Serie A, com 163 gols, e o segundo maior da Coppa Italia, com oito a menos que Altobelli, citado acima. O bomber também foi o principal goleador do campeonato nacional em 1971 e 1972.

Boninsegna começou a carreira como ponta-esquerda, nos juvenis da Inter, mas não foi aproveitado pelo clube nesta função e acabou sendo cedido a clubes menores. Após estrear na Serie A pelo Varese, passou ao Cagliari e só na Sardenha se transformou em centroavante, por causa da concorrência com o craque Gigi Riva. A mudança fez sua carreira dar um salto e, após as ótimas campanhas pelos casteddu, retornou a Milão. Em sete anos pela Beneamata, Bonimba se tornou um dos maiores atacantes da história nerazzurra, e o terceiro principal artilheiro do clube, com 171 gols, mas só conquistou um título – o scudetto, em 1971.

Depois disso, o jogador raçudo e oportunista ainda levou seu estilo tipicamente italiano para o comando do ataque da Juventus. As rivais entraram em acordo e decidiram trocar atacantes: Pietro Anastasi, de 28 anos, foi para Milão, e Boninsegna, com quase 33, rumou para Turim. Na reta final da carreira, o bomber viveu uma segunda juventude e brilhou na conquista dos scudetti de 1977 e 1978 e na Copa Uefa de 1977 – o primeiro troféu continental da Juve. Bonimba ainda ganhou uma Coppa Italia e deixou o clube para se aposentar nas categorias inferiores.

Os outros jogadores que defenderam Inter e Juventus

Luigi Allemandi, Pietro Anastasi, Emil Audero, Dino Baggio, Roberto Baggio, Angelo Balbiani, Savino Bellini, Jonatan Binotto, Mario Bo, Luciano Bodini, Ernesto Boglietti, Leonardo Bonucci, Liam Brady, João Cancelo, Enrico Candiani, Antonio Candreva, Fabián Carini, Filippo Cavalli, Carlo Ceresoli, Luigi Cevenini, Giordano Colausig, Aristide Coscia, Juan Guillermo Cuadrado, Antonio Dalmonte, Oscar Damiani, Edgar Davids, Luigi De Agostini, Michele Di Gregorio, Armando Diena, Erminio Favalli, Rino Ferrario, Luigi Ferrero, Salvatore Fresi, Guido Gianfardoni, Sergio Gori, Zlatan Ibrahimovic, Vladimir Jugovic, Ugo Locatelli, Luciano Marangon, Giuseppe Meazza, Felipe Melo, Marcello Mihalich, Adrian Mutu, Giacomo Neri, Andrea Pirlo, Renato Olmi, Pablo Osvaldo, Antonio Payer, Carlo Payer, Giuseppe Peruchetti, Tommaso Rocchi, Luigi Sartor, Salvatore Schillaci, Pietro Serantoni, Aldo Serena, Michele Serena, Stefano Tacconi, Roberto Tricella, Giuseppe Viani, Arturo Vidal, Patrick Vieira, Christian Vieri, József Viola e Cristiano Zanetti.

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