Há jogadores que aproveitam os momentos de maiores glórias de um clube para brilharem com maior intensidade e existem também aqueles que se destacam nos períodos de maior incerteza. Roberto Antonelli, embora tenha contribuído para um scudetto do Milan, certamente se encaixa no segundo grupo. Com caráter, dedicação e gols, o ponta-direita ajudou o Diavolo a atravessar um dos momentos mais nefastos de sua história: a disputa de sua primeira Serie B.
Roberto nasceu em maio de 1953, na pequena cidade de Morbegno, perto da fronteira com a Suíça. Foi na própria Lombardia que começou sua carreira futebolística: deixou a província de Sondrio para rumar a Monza e Brianza, onde deu seus primeiros passos no Monza. Pelo clube biancorosso, Antonelli se profissionalizou em 1972.
Ponta-direita que se destacava pelas fintas e pelo controle de bola, Antonelli estreou com a camisa do Monza na Serie B de 1972-73. E o fez com o pé direito: anotou o gol da vitória sobre o Taranto, pela oitava rodada. Apesar disso, o jovem de 19 anos não marcou mais vezes e os brianzoli foram rebaixados.
Na terceirona, Antonelli ganhou mais espaço e desabrochou num time que tinha ainda os igualmente jovens Giuliano Terraneo, Ruben Buriani e Patrizio Sala, além do experiente Roberto Anzolin. O Monza ficou perto do acesso em 1974 e 1975, mas, se não conseguiu a promoção, ao menos mostrou força ao conquistar o bicampeonato da Coppa Italia de Semiprofissionais.
Nessa época, o atacante chamou atenção por algo além de sua semelhança com o ator norte-americano Dustin Hoffman, que lhe rendeu o apelido com o qual ficaria conhecido – obviamente, “Dustin”. Antonelli foi emprestado ao Vicenza, que disputaria a Serie B com um time forte, candidato ao imediato retorno à elite. Contudo, o elenco que tinha nomes como Luciano Marangon, Agostino Di Bartolomei, Massimo Briaschi e Angelo Sormani não deu liga e acabou se salvando do rebaixamento por poucos pontos.
Após a malfadada experiência pelos lanerossi, pelos quais disputou somente 16 partidas e marcou um gol, Dustin retornou ao Monza, que conseguira o acesso à Serie B. Em sua segunda passagem pelos brianzoli, contribuiu para uma excelente campanha: o time não conseguiu a promoção direta apenas por dois pontos. Os biancorossi podem até não terem conseguido o acesso, mas Antonelli, sim: os 22 jogos, três tentos e consistentes atuações pelo flanco direito do ataque lhe renderam uma transferência ao Milan, juntamente aos companheiros Buriani e Ugo Tosetto.
No Diavolo, Antonelli, de 24 anos, precisaria vencer a concorrência de Albertino Bigon e, às vezes, do ícone Gianni Rivera, que podia atuar como ponta, para se firmar. Difícil, visto que eles eram, respectivamente, vice-capitão e capitão do time recém-campeão da Coppa Italia. Na primeira temporada, não conseguiu ganhar a titularidade no onze inicial de Nils Liedholm, mas foi um reserva frequente: estreou contra o Betis, pela Recopa Uefa, e somou em 17 partidas, com dois gols marcados. O Milan não teve sucesso nas copas e terminou a campanha de 1977-78 na quarta colocação da Serie A.
Na temporada seguinte, Dustin jogou mais pela equipe rossonera, uma vez que o Milan negociou o centroavante Egidio Calloni com o Verona e Bigon passou a atuar centralizado, tendo o suporte de Roberto, Rivera e Walter Novellino. A mudança feita por Liedholm se provou fundamental para Antonelli, que fez 29 partidas e se portou como um fiel escudeiro do colega de setor: anotou cinco gols e forneceu três assistências. Bigon foi o artilheiro rubro-negro naquela Serie A, com 12 tentos.
As atuações da dupla foram fulcrais para o Diavolo – e históricas. Afinal, a campanha de 1978-79 resultou no décimo scudetto da história do clube: o título que deu ao time rubro-negro o direito de ostentar uma estrela no peito. Dustin, portanto, colocava o seu nome no panteão de estrelas dos rossoneri. Naquele mesmo ano, também chegou a ser convocado para a seleção olímpica italiana.
Na temporada de 1979-80, Antonelli já havia se tornado peça fundamental da equipe e assumiu mais responsabilidades, uma vez que o craque Rivera tinha se aposentado e um novo ciclo, agora com o técnico Massimo Giacomini, se iniciava – com Dustin entre os protagonistas. No entanto, a alegria dos rossoneri durou muito pouco e a precoce eliminação na Copa dos Campeões, quando caiu na primeira fase ante o Porto, parecia um prenúncio do que estava por vir.
O Milan terminou a Serie A na terceira posição dentro de campo. Seria um desfecho tranquilo se não tivesse eclodido o Totonero, um escândalo de apostas ilegais que via envolvidos os rossoneri Enrico Albertosi, Giorgio Morini e Stefano Chiodi. Como punição, o Diavolo foi rebaixado para a Serie B juntamente à Lazio, que também teve atletas partícipes do esquema.
No momento das dificuldades, porém, Antonelli foi um daqueles que bateram no peito e assumiram a responsabilidade. Na época, a diferença econômica entre as séries A e B não era tão abissal quanto hoje, de forma que o Milan foi capaz de manter muitos jogadores – até porque tinha um elenco bastante jovem no momento. Um dos mais experientes era justamente Dustin, então com 27 anos. Na segundona, ele tirou forças de onde parecia não ter e liderou os rubro-negros.
Antonelli não era reconhecido como um artilheiro consagrado até aquele verão de 1980. A bem da verdade, na temporada mais prolífica de sua carreira, a do scudetto com o Milan, tinha feito somente cinco gols. Isso mudou numa das campanhas mais importantes da história do Diavolo: a da agonia, que precisava culminar no retorno à elite.
O resultado desejado foi obtido principalmente por conta de Dustin, que encontrou uma verve goleadora até então desconhecida: anotou em jogos importantes, como naqueles ante Genoa, Lazio, Cesena e Pisa, além de contribuir para o rebaixamento do seu querido Monza. Roberto terminou a temporada como artilheiro da Serie B, com 15 gols, e ajudou celebrou o título da categoria como protagonista.
Na volta do Milan à elite italiana, Antonelli já era ídolo da torcida milanista e era aclamado pelas ruas de Milão. Porém, seus momentos de alegria em San Siro nunca foram muito duradouros. Naqueles tempos, o clube vivia muita instabilidade financeira e gerencial, o que afetava também o que acontecia em campo. E Dustin acabaria protagonizando um filme de terror.
Roberto voltara a atuar na ponta na temporada 1981-82, cedendo o comando do ataque ao escocês Joe Jordan, mas a modificação não deu certo. Em toda a campanha, o time rossonero mostrou imensa dificuldade de marcar: em 15 das 30 rodadas, passou em branco. A equipe terminou a Serie A com apenas 21 gols marcados, tendo Antonelli como artilheiro – com apenas quatro bolas nas redes. Nem mesmo de pênalti a formação dirigida por Luigi Radice tinha facilidade para anotar. E até Dustin falhava: acabou desperdiçando uma penalidade vital na derrota para o Como, lanterna da competição.
Com esse desempenho pífio, o Milan acabou sendo rebaixado, dessa vez em campo. O time somou 24 pontos e viveu um drama na última rodada: mesmo com vitória sobre o Cesena, com gol de Antonelli, foi suficiente. O gol de Dustin saiu aos 81 minutos, mas, aos 85, Mario Faccenda marcou o tento que garantiu o empate por 2 a 2 entre Napoli e Genoa. Por um pontinho, os genoveses permaneceram na elite.
Os problemas financeiros intensificados com a gestão de Giuseppe Farina levaram o Milan a promover uma profunda reformulação, com a venda de diversos pilares do time. Antonelli foi um deles e rumou justamente ao Genoa. Sob o comando de Luigi Simoni, o atacante lombardo teve uma boa primeira temporada.
Dustin anotou sete gols em 23 jogos e foi fundamental para que o time escapasse do descenso numa Serie A bastante equilibrada, na qual a diferença entre o Avellino, nono colocado, e o Cagliari, 14º, primeiro rebaixado, foi de apenas dois pontos. Seus tentos mais importantes ocorreram em triunfos sobre Cesena (duas vezes) e Catanzaro, concorrentes diretos.
Mas, como já se provara habitual na carreira do atacante, a felicidade durava pouco. Em 1983-84, Antonelli até jogou mais vezes, mas atuando como suporte a Massimo Briaschi. A fonte do veterano, já beirando os 31 anos, secou: marcou só dois gols e viu o Genoa ser rebaixado por desvantagem no confronto direto com a Lazio.
A Lazio, aliás, foi a última equipe contra a qual Roberto comemorou um gol na Serie A. E que comemoração: afinal, em 1984-85, era um jogador da Roma. O tento no Derby della Capitale, terminado em 1 a 1, foi a única alegria que Dustin teve na Cidade Eterna. O atacante perdeu quase metade da temporada por causa de uma lesão no tendão de Aquiles e disputou somente 11 partidas pelos giallorossi – no Italiano, só uma vez começou como titular.
Sem condições físicas de atuar no mais alto nível após a lesão, Antonelli trocou a Roma pelo Monza em 1985. O atacante foi um dos grandes reforços dos brianzoli para a disputa da Serie B e até teve uma participação razoável na campanha do time: atuou em 22 jogos, com quatro gols marcados. Porém, os biancorossi seguraram a lanterna e acabaram sendo rebaixados para a terceirona. Foi a deixa para Dustin encerrar a sua carreira, aos 33 anos.
Depois de quatro temporadas fora do futebol, Roberto Antonelli se tornou técnico. Porém, não teve nenhum sucesso nessa empreitada: acumulou resultados inexpressivos por Caratese, Casarano, Pro Sesto e Seregno, além de um rebaixamento à Serie C2 pelo Novara. No Monza, teve o ápice da carreira, ao dirigir o time e salvá-lo do rebaixamento na segundona – mas, na sequência, dirigi-lo por algumas rodadas em campanhas que culminaram em descensos.
Roberto deixou uma herança bem palpável para o futebol: o lateral-esquerdo Luca Antonelli, seu filho, defendeu o Milan por quatro anos, teve passagens por Parma e Genoa e também representou a seleção em 13 oportunidades. Mas, obviamente, Dustin também transmitiu um legado intangível. Sua dedicação ao Diavolo, representadas por 143 partidas e 32 gols marcados, além da estrela costurada no peito dos rossoneri e da escalada rumo à elite, lhe renderam um lugar no Hall da Fama do clube.
Roberto Antonelli
Nascimento: 29 de maio de 1953, em Morbegno, Itália
Posição: atacante
Clubes como jogador: Monza (1972-75, 1976-77 e 1985-86), Milan (1977-82), Genoa (1982-84) e Roma (1984-85)
Títulos como jogador: Coppa Italia de Semiprofissionais (1974 e 1975), Serie A (1979), Serie B (1981) e Copa Mitropa (1982)
Clubes como treinador: Caratese (1990-93 e 2004-06), Casarano (1993-94 e 1995-96), Pro Sesto (1994-95), Novara (1996-97), Monza (1999-2001 e 2001-02) e Seregno (2002-03)