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Antonio Chimenti fez sucesso na província e virou reserva de uma Juventus campeã

Era março de 2010. O dia não estava muito bom para o goleiro Antonio Chimenti, atleta da Juventus: ele falhara no gol que decretou a derrota da Velha Senhora para a Sampdoria, em Gênova. Nos vestiários do estádio Luigi Ferraris, o mau humor causou o episódio mais curioso de seus 22 anos de carreira.

“Eu estava muito nervoso e, quando entrei no vestiário, dei um soco numa mesa. Infelizmente, fraturei a mão”, explicou o próprio Chimenti. A atitude destemperada o afastou dos gramados logo depois de uma partida em que havia sido titular, aproveitando as lesões de Gianluigi Buffon e Alexander Manninger. Meses depois, a aposentadoria.

A mão quebrada é apenas uma nota de rodapé. Zucchina (abobrinha, em italiano), como era conhecido, em virtude do formato de sua cabeça, experimentou as dores e as delícias do futebol, mesmo não sendo sempre protagonista – e, volta e meia, tendo lapsos dessa natureza.

Nos tempos em que ainda tinha algum cabelo, Chimenti foi ídolo da Salernitana, nas divisões inferiores (Wikipedia)

Os primeiros passos e o destaque em grená

Natural de Bari, Antonio integra uma família de futebolistas. O sobrenome Chimenti já era famoso no centro-sul da Itália por conta de Vito, seu tio, que brilhou pelo Palermo e disputou a Serie A por Catanzaro, Pistoiese e Avellino. Já Francesco, pai do ex-goleiro, foi um dos maiores ídolos da Sambenedettese, equipe da região das Marcas. Ambos eram atacantes, mas Zucchina decidiu seguir caminho diferente.

A trajetória de Chimenti começou em 1980, na Sambenedettese. Seguindo os passos do pai, entrou nas categorias de base do clube rossoblù aos 10 anos e, em 1988, se profissionalizou. Como reserva, o jovem disputou as séries B, C1 e C2 pela Samb, até se transferir para o Tempio, da Sardenha, em busca de espaço. Após ser titular do time sardo na quarta divisão, o goleiro teve uma experiência como suplente na segunda, pelo Monza. Em 1993, aos 23 anos, mudou-se para a Salernitana e assumiu a titularidade para disputar a Serie C1.

Em seu primeiro ano na Campânia, Chimenti contribuiu para que a Salernitana fosse terceira colocada no Grupo B da terceirona. A equipe conseguiu a vaga nos playoff para, na semifinal, vencer a Lodigiani. A promoção para a Serie B viria com uma vitória contundente sobre a Juve Stabia por 3 a 0, com Chimenti fechando o gol. O estádio Arechi pulsava e Salerno estava em lágrimas pela nova chance na segunda divisão.

O acesso para a principal categoria do futebol italiano quase veio logo de cara, mas a Salernitana bateu na trave em duas oportunidades: foi quinta colocada da Serie B em 1994-95 e 1995-96, uma posição abaixo do necessário para a promoção. Na segunda campanha, Chimenti teve muito destaque em partida contra o Ancona, na qual defendeu duas cobranças de pênalti e garantiu o triunfo dos campanos. A temporada 1996-97 não foi das melhores e o time grená terminou o campeonato no 15º lugar, a três pontos da zona de rebaixamento.

Chimenti disputou 140 partidas pela Salernitana e chamou a atenção da elite italiana. Chamado por Franco Sensi, dono da Roma, arrumou as malas e se mudou para a Cidade Eterna. Veria, de longe, o time de Salerno vencer a segundona no ano de sua saída e, finalmente, alcançar a Serie A.

Chimenti estreou na Serie A e nas competições europeias como atleta da Roma (imago/Allstar)

Destino: capital

O desempenho ruim da Salernitana naquele campeonato de 1996-97 não apagou as boas temporadas que Antonio realizara com a camisa granatas. Contratado pela Roma, Chimenti precisou disputar posição com o experiente Michael Konsel e o jovem Andrea Campagnolo. Todos foram adquiridos na mesma janela de mercado, uma vez que a Loba reformulava o setor, após se desfazer de Giovanni Cervone, Giorgio Sterchele e Gianluca Berti.

Logo ficou claro que o austríaco seria a primeira escolha do técnico Zdenek Zeman para 1997-98, o que não foi de todo ruim para Chimenti, que poderia se ambientar ao clima e à pressão típicas da capital. Contudo, a sua estreia aconteceu de forma inesperada, num momento de tensão: em partida contra o Lecce, válida pela terceira rodada do Italiano, Konsel foi expulso aos 38 minutos por cometer pênalti sobre Riccardo Maspero, o que obrigou Zeman a lançar Antonio. A situação era complicada para o apuliano, mas o seu primeiro ato na elite foi defender a cobrança de Francesco Palmieri. O jogo estava empatado em 0 a 0 e terminou com triunfo romanista, por 3 a 1.

O careca teria mais tempo de jogo em sua segunda temporada. Konsel sofreu várias lesões, sendo a mais séria delas no tendão de Aquiles. Assim, Zucchina assumiu a baliza durante a maior parte da temporada, sendo titular na Serie A e na Copa Uefa. Até então, aquele era o maior desafio de sua carreira.

E não se poderia falar em desafio sem citar o Derby della Capitale, na 11ª rodada da Serie A 1998-99. Titular, Chimenti viu a Roma abrir o placar, mas não teve tempo de comemorar: o empate da Lazio foi imediato, com mais dois gols na segunda etapa. Milagrosamente a Loba conseguiu igualar, mesmo com um a menos em campo. Os giallorossi ainda marcaram o quarto gol, que foi anulado – assim como o quarto dos biancocelestes também havia sido. No último lance, Dejan Stankovic invadiu a área, sozinho, e bateu cruzado. Chimenti pegou e garantiu o empate.

Em termos de resultados gerais, Antonio não obteve nada muito promissor na capital. A equipe terminou o campeonato na quarta e na quinta posições naquelas temporadas e Chimenti não resistiu à nova revolução no gol romanista, provocada pela contratação de Fabio Capello para a temporada 1999-2000. Apesar disso, o apuliano e sua lustrosa careca deixaram impressão positiva – principalmente na região em que nasceu. Assim, o arqueiro se transferiu para o Lecce para ser titular.

Zucchina passou três anos no calcanhar da Bota e realizou 104 jogos pela equipe giallorossa. Mantendo um ótimo nível de atuações, Chimenti ajudou o time de Alberto Cavasin a garantir a permanência na elite nas duas primeiras temporadas. Em seu último ano no Lecce, reencontraria um velho conhecido: Delio Rossi, seu treinador na Salernitana, foi contratado com a campanha em andamento para substituir Cavasin e tentar salvar o time da degola. Não conseguiu.

Antonio, entretanto, caiu para cima. A temporada 2002-03 marcaria uma mudança completa na sua vida: se salvou do rebaixamento e foi contratado pela campeã Juventus. E lá viveria os anos mais vitoriosos (e ociosos) de sua carreira.

Atuações seguras pelo Lecce renderam a Chimenti o posto de alternativa a Buffon, na Juventus (imago/Buzzi)

Reserva de uma lenda

Na segunda temporada da segunda passagem por Turim, Marcello Lippi ganhou excelentes reforços, em negócios intermediados por Luciano Moggi. O diretor levou Chimenti para ser opção a Buffon, liberou Michelangelo Rampulla, já com seus 40 anos, e trocou Fabián Carini por Fabio Cannavaro.

Como se poderia esperar, sendo reserva de quem era, Chimenti fez pouquíssimos jogos nessa passagem pelo Piemonte – foram 34 partidas, quase todas em jogos de copas e da reta final da Serie a. Trocou tempo em campo por títulos, que até então não tinha conquistado. Como reserva, ganhou um scudetto em 2003, foi bicampeão da Supercopa Italiana, em 2002 e 2003, e ainda amargou um vice-campeonato na Champions League, nada podendo fazer para evitar a derrota nos pênaltis para o Milan.

A ociosidade não fez bem para a forma do goleiro apuliano. Quando foi chamado em causa em jogos grandes, por algum problema físico de Buffon, Chimenti não respondeu à altura nem mostrou o bom nível dos anos anteriores. Sem passar segurança para a defesa bianconera, levou gols defensáveis em derrota para o Manchester United, na Champions League 2002-03, e cometeu falha em cobrança de falta de Andrea Pirlo numa derrota por 3 a 1 para o Milan, na Serie A 2005-06.

Na semifinal de volta da Coppa Italia da temporada anterior, viu Adriano lhe humilhar com um drible por entre as pernas antes de marcar o primeiro da Inter e errou na rebatida que permitiu a Daniele Adani empatar a partida aos 49 da etapa final. Nas penalidades, se redimiu ao defender o chute de Christian Vieri e classificar a Juventus para a decisão, ocasião em que voltou a mostrar sua irregularidade. Na derrota para a Lazio no primeiro jogo das finais – vencidas pelos celestes –, Chimenti cometeu e defendeu pênalti, além de ter engolido um frangaço que só não entrou na contagem porque Pierluigi Collina apitou falta de Bernardo Corradi no lance.

Ao contrário de outros momentos de sua carreira, Antonio não pode contar com a sorte em 2005. Buffon sofreu uma séria lesão na pré-temporada, o que poderia ser uma oportunidade para que ele se firmasse no gol da Vecchia Signora, ao menos enquanto o titular se recuperava. Contudo, as falhas cometidas fizeram com que a diretoria optasse pelo empréstimo de Christian Abbiati junto ao Milan.

Percebendo que jamais teria uma chance real, Chimenti não esperou a temporada terminar. Deixou Turim em janeiro de 2006, visando a titularidade no Cagliari. Saiu do clube antes do estouro do escândalo Calciopoli, mas mesmo assim foi um dos chamados a depor nos tribunais – assim como Buffon, Mark Iuliano e Enzo Maresca.

Zucchina ficou na Sardenha durante um ano e meio. Comandado pelo instável presidente Massimo Cellino, o Cagliari da época representava o estado de espírito do seu dono: envolto em turbulências, se salvava do rebaixamento com dificuldade. Titular dos rossoblù, Chimenti contribuiu com duas permanências, sendo que em 2006-07 precisou ficar afastado dos campos por quatro meses, devido a uma lesão no ombro. Depois disso, o veterano rumou à Udinese, onde amargou mais uma temporada como reserva.

Com 38 anos, precisava tomar uma decisão. Era hora de voltar para Turim, dessa vez como terceiro goleiro da Juventus. Pouco pode fazer em suas duas últimas temporadas como profissional: contabilizou apenas três partidas. E, claro, uma mão quebrada.

No Cagliari, já veterano, Chimenti teve suas últimas temporadas como titular na elite (imago/IPA)

Chuteiras aposentadas, luvas calçadas

Aposentado em 2010, Chimenti não ficou parado. Começou a carreira fora dos gramados como preparador de goleiros das divisões de base da Juventus e também exerceu a função nas seleções jovens da Itália e na Sampdoria. Antonio também foi auxiliar técnico do amigo Luigi Di Biagio na Spal, em 2020.

O goleiro chegou a voltar aos campos (ou melhor, às quadras) em uma iniciativa da Roma, que reuniu um time de masters para partidas do famoso showbol. A equipe era formada por nomes como Marco Delvecchio, Damiano Tommasi e Max Tonetto.

Antonio Chimenti não foi um astro e nem mesmo figura entre os mais famosos goleiros italianos, mas pode se orgulhar de ter vivido grandes momentos no esporte: fez Salerno vibrar com um acesso, jogou clássicos importantes, chegou à final da Champions League e levantou taças em um dos maiores clubes da Itália e do mundo. Privilégio para poucos.

Antonio Chimenti
Nascimento: 30 de junho de 1970, em Bari, Itália
Posição: goleiro
Clubes: Sambenedettese (1988-91), Tempio (1991-92), Monza (1992-93), Salernitana (1993-97), Roma (1997-99), Lecce (1999-2002), Juventus (2002-06 e 2008-10), Cagliari (2006-07) e Udinese (2007-08)
Títulos: Supercopa Italiana (2002 e 2003) e Serie A (2003)

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1 Comentário

  • Grande goleiro, especialmente no Lecce. Na Roma era reserva do Konsel. Não tinha grande estatura mas voava impressionantemente nas bolas! Foi responsável direto pela manutenção do clube giallorosso na Serie A por anos consecutivos no início dos anos 2000, algo que não acontecia, já que o Lecce, que tem uma das melhores e mais fanáticas torcidas do país, era “elevador”, subia pra cair no ano seguinte. Se o Lecce fosse um clube brasileiro, seria o Santa Cruz.

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