Contar com um atacante do calibre de Adriano é uma mão na roda para os momentos mais complicados. Jogadores assim facilitam o papel de qualquer treinador e, principalmente, alegram os torcedores. Foi exatamente essa combinação que o Imperador conseguiu atingir no início de 2005, pela Inter: o duelo contra o Porto, pelas oitavas de final da Liga dos Campeões da temporada 2004-05, serviu como um retrato do poder de fogo de um dos maiores atacantes da história da equipe nerazzurra e do futebol italiano.
Antes de tudo, o adversário da Inter não era qualquer um. Era um forte Porto, então vencedor da Liga dos Campeões. Em 2003-04, os dragões tiveram uma campanha surpreendente, que foi coroada com o título na final diante do Monaco com gols de Carlos Alberto, Deco e do russo Dmitri Alenichev – este, anos antes, teve passagens por Roma e Perugia. Portanto, a missão não era das mais fáceis, apesar de o time do norte de Portugal ter perdido para o Chelsea o seu treinador (José Mourinho) e um dos principais jogadores (Deco).
O caminho dos dois clubes na competição se cruzou nas oitavas de final. Quarta colocada na Serie A 2003-04, a Inter teve um caminho mais longo do que o adversário, já que entrou na terceira fase de qualificação, etapa em que precisou vencer os suíços do Basel por 4 a 1, depois de ter empatado na partida de ida em 1 a 1. Superado esse desafio, os italianos não tiveram muitas dificuldades na fase de grupos. Lideraram a chave com Werder Bremen, Valencia e Anderlecht, sem nenhuma derrota.
O Porto, por sua vez, entrou direto na fase de grupos por ter sido vencedor da edição anterior. Além disso, também tinha o status de ser campeão português. Avançou em segundo, atrás somente do Chelsea, em uma chave que ainda tinha CSKA Moscou e Paris Saint-Germain. Assim, o sorteio das oitavas colocou frente a frente as duas equipes, sendo que os italianos, como todos os classificados em primeiro lugar, tinham a vantagem de decidir em casa.
No dia 23 de fevereiro de 2005, quando chegou a Portugal para encarar os azuis e brancos, a Inter não tinha nenhuma derrota na temporada, o que era ótimo. Mas, em contrapartida, empilhava empates: eram três na Champions League e 16 só na Serie A àquela altura, uma marca abastecida pelas sete paridades consecutivas entre a 7ª e a 13ª rodadas do certame nacional. Para o jogo contra o time português, o técnico Roberto Mancini optou por poupar Álvaro Recoba, Edgar Davids e Christian Vieri, já pensando no clássico contra o Milan, pelo campeonato, no fim de semana seguinte.
Do outro lado, o meia Diego era o único desfalque para José Couceiro. O brasileiro havia sido expulso na final do Mundial Interclubes, disputado em dezembro, depois dos seis jogos da fase de grupos da Liga dos Campeões. Na ocasião, o Porto conquistou o mundo pela segunda vez ao vencer o Once Caldas, da Colômbia.
O Estádio do Dragão recebeu um confronto bastante equilibrado. Jogando fora de casa, a Inter apostou na velocidade de sua dupla de ataque, formada por Obafemi Martins e Adriano, para conseguir um bom resultado para o duelo de volta. Já o Porto fortaleceu o meio-campo e teve o sul-africano Benni McCarthy como o único homem de frente.
Ambos os times trocaram oportunidades de gol até os 24 minutos, quando a Inter abriu o placar. Ainda no campo de defesa, Giuseppe Favalli efetuou um ótimo passe em profundidade para Dejan Stankovic. O meia sérvio avançou, venceu o duelo com Giourkas Seitaridis e cruzou nos pés de Oba Oba. O atacante nigeriano, por sua vez, não teve nenhuma dificuldade para empurrar para a baliza desguarnecida e abrir o marcador.
O Porto também não contou com a sorte. Quatro minutos depois de sofrer o gol, José Bosingwa sentiu e precisou sair de campo para a entrada do brasileiro Luís Fabiano. Ou seja, Couceiro tirava um jogador de contenção para colocar um atacante, buscando dificultar o trabalho do time de Mancini, que estava com vantagem no placar.
Com mais um homem de frente, os dragões pressionavam mais a saída de bola italiana. A mudança de postura incomodou e o Porto conseguiu igualar o placar na segunda etapa. Aos 61 minutos, Nuno Valente efetuou um cruzamento bem alto na segunda trave, Francesco Toldo saiu mal, Costinha colocou a pelota para o meio da área e o zagueiro Ricardo Costa empurrou para o fundo das redes.
Mancini até chegou a colocar Vieri no final da partida, no lugar de Adriano, mas a dupla acabou passando em branco naquela noite. No fim das contas, o empate acabou sendo um resultado importante para os italianos, que jogavam fora de seus domínios contra o então campeão europeu e mundial.
Antes da peleja de volta contra o Porto, a Inter foi a campo no clássico contra o Milan, pela Serie A, e conheceu a primeira derrota na temporada – um presságio de quanto os rossoneri encarnariam o papel de pedra no sapato dos interistas em 2004-05. Os nerazzurri perderam o Derby della Madonnina por 1 a 0, graças a gol solitário de Kaká.
No jogo de volta das oitavas da competição europeia, no fim da primeira quinzena de março, a magia de Adriano prevaleceu. Foi diante do Porto, em San Siro, que o Imperador anotou uma tripletta pela segunda vez com a camisa da Inter – foram quatro, no total – e que entregou uma das atuações mais dominantes de toda a sua carreira como profissional.
Logo aos 6 minutos, um erro bobo de passe, por parte de Diego, facilitou as coisas para a Inter. A bola se ofereceu para Adriano e o camisa 10 se impôs: venceu o duelo contra Jorge Costa e chutou cruzado. O arremate desviou em Pedro Emanuel, a pelota subiu e encobriu o goleiro Vítor Baía, que nada pode fazer. Ricardo Costa ainda tentou salvar, porém não conseguiu. Estava feito o primeiro gol do Imperador.
No segundo tempo, o espetáculo continuou. O Porto deu espaço para Julio Cruz e o atacante argentino viu Adriano entrando livre na área. O brasileiro recebeu em profundidade, deixou a bola correr e, de perna esquerda, com a parte externa do pé, efetuou um arremate alto e improvável, no canto de Vítor Baía, que foi surpreendido: 2 a 0 para a Inter, quando o relógio já marcava 63 minutos.
Foi um duro golpe no time português, que ainda tentou empatar. Logo após o tento, Seitaridis espirrou o taco na hora de fazer o cruzamento e quase surpreendeu Toldo – a bola bateu no pé da trave italiana. Ricardo Quaresma levou perigo com seu tradicional chute de trivela e McCarthy ainda arriscou de fora da área. Aos 69 minutos, então, o Porto diminuiu: Quaresma cobrou escanteio fechado e o goleiro da Inter rebateu. Jorge Costa não desperdiçou o rebote e fez 2 a 1.
Com o passar dos minutos, o clima ia ficando ainda mais dramático. Isso porque o Porto se classificaria com um empate por dois gols e, do outro lado, a Inter não aproveitava os espaços deixados pelos visitantes. Na chance mais clara de contra-ataque, aos 81 minutos, Javier Zanetti roubou a bola no meio-campo, passou como quis pela defesa e driblou o goleiro. O capitão finalizou para a baliza, mas Pedro Emanuel apareceu como uma flecha e cortou em cima da linha.
Melhor em campo, a Inter tranquilizou a sua torcida aos 87, com a tripletta de Adriano. Com o Porto todo no ataque, Juan Sebastián Verón enfiou mais uma bola em profundidade para o camisa 10, que driblou Nuno Valente, cortou para dentro e chutou rasteiro, com a perna esquerda, no canto de Vítor Baía. O 3 a 1 liquidava a fatura e garantia a Beneamata nas quartas da Champions League.
Depois de avançar sobre os portugueses, a Inter enfrentou o Milan. Os milanistas, comandados na altura por Carlo Ancelotti, levaram a melhor mais uma vez. Os rossoneri venceram o jogo de ida por 2 a 0, com gols de Jaap Stam e Andriy Shevchenko, e ganhavam a volta por 1 a 0, com novo tento do carrasco ucraniano, quando uma chuva de sinalizadores interrompeu o clássico – um deles atingiu Dida, que não pode continuar.
A Inter foi punida pela Uefa com uma derrota por 3 a 0 e o rival foi adiante no torneio. Contudo, o Milan seria vice-campeão perante o Liverpool, na fatídica final de Istambul. A Beneamata, por sua vez, pôs fim a um jejum de sete anos sem troféus ao concluir a temporada com o título da Coppa Italia, novamente com show de Adriano.
Porto 1-1 Inter
Porto: Vitor Baía; Seitaridis, Ricardo Costa, Pedro Emanuel, Nuno Valente; Bosingwa (Luís Fabiano), Costinha, Maniche, Raul Meireles, Quaresma (Hélder Postiga); McCarthy. Técnico: José Couceiro.
Inter: Toldo; J. Zanetti, Córdoba, Materazzi, Favalli; Verón (Belözoglu), C. Zanetti, Cambiasso; Stankovic; Martins, Adriano (Vieri). Técnico: Roberto Mancini.
Gols: Martins (24′); Ricardo Costa (61’)
Árbitro: Graham Poll (Inglaterra)
Local e data: Estádio do Dragão, Porto (Portugal), em 23 de fevereiro de 2005
Inter 3-1 Porto
Inter: Toldo; Zé Maria, Materazzi, Mihajlovic, J. Zanetti; Verón (Van der Meyde), C. Zanetti, Cambiasso; Stankovic (Kily González); Cruz (Martins), Adriano. Técnico: Roberto Mancini.
Porto: Vitor Baía; Seitaridis, Jorge Costa, Ricardo Costa (Hélder Postiga), Pedro Emanuel (Pepe), Nuno Valente; Costinha, Maniche, Diego; McCarthy, Mejolaro (Quaresma). Técnico: José Couceiro.
Gols: Adriano (6′, 63′, 87′); Jorge Costa (69’)
Árbitro: Terje Hauge (Noruega)
Local e data: estádio Giuseppe Meazza, Milão (Itália), em 15 de março de 2005