Jogos históricos

Em 1996, a Juventus brilhava fora da Itália e triunfava sobre o ótimo esquadrão do River Plate

Por incrível que pareça, um dos mais recentes títulos internacionais da Juventus foi ainda no século passado. O ano era 1996, a Velha Senhora tinha vencido a sonhada Liga dos Campeões — depois de abdicar da disputa da Serie A, contra o Milan — e viajava para Tóquio em novembro, em busca da segunda conquista da Copa Intercontinental. Assim como nas outras duas participações, em 1973 e em 1985, o adversário da Juve seria uma equipe argentina: o River Plate, que tinha um esquadrão repleto de craques que brilhariam no futebol europeu posteriormente.

Os antecedentes

A Juventus carimbou sua vaga no Mundial Interclubes depois de bater o Ajax na final da Liga dos Campeões. O time de Amsterdã era, sem dúvidas, um adversário formidável, que contava com uma das melhores safras de sua história. Com Edgar Davids, Edwin van der Sar, Patrick Kluivert, Danny Blind, Nwankwo Kanu, os irmãos Frank e Ronald De Boer e outros craques, vinham de dois títulos holandeses consecutivos e da conquista da Liga dos Campeões do ano anterior.

No entanto, do outro lado havia uma Juventus bem montada por Marcello Lippi, em seu segundo ano à frente da equipe. Era a primeira temporada sem Roberto Baggio, que tinha partido para o Milan, mas um jovem Alessandro Del Piero havia herdado sua vaga e formado um trio de ataque letal ao lado de Gianluca Vialli e Fabrizio Ravanelli. Eles recebiam o suporte de Didier Deschamps e Antonio Conte na meiuca.

Na grande decisão, os italianos foram superiores, mas o placar de 1 a 1 prevaleceu e o título foi decidido nas penalidades. Foi quando a estrela de Peruzzi brilhou: o goleiro defendeu a primeira e a quarta cobrança dos holandeses, garantindo a vitória para a Velha Senhora, que alçou a orelhuda em solo italiano, no Olímpico de Roma.

Contratado pela Juventus em 1996, Boksic abusou das chances perdidas contra o River (imago/AFLOSPORT)

No mês seguinte, foi a vez de o River Plate, treinado por Ramón Díaz, se garantir no Intercontinental. A Copa Libertadores seria decidida contra o América de Cali, que havia sido vice-campeão contra os Millonarios dez anos antes. Na ida, os colombianos jogaram melhor e venceram por 1 a 0, graças ao golaço de Antony Ávila. A volta estava marcada para 26 de junho e o River precisava reverter a vantagem para alcançar a Glória Eterna. Naquele dia, mais de 70 mil espectadores viram um prata da casa decidir o jogo. Hernán Crespo, que meses depois começaria a escrever sua história no futebol italiano, marcou duas vezes para os argentinos e deu o bicampeonato continental ao clube do Monumental de Nuñez.

Antes do embate entre argentinos e italianos, os times passaram por reformulações no elenco. A Juve não tinha mais Ravanelli nem Vialli no ataque, porém se reforçara com bons nomes no verão de 1996: Alen Boksic, da Lazio; Mark Iuliano, da Salernitana; Nicola Amoruso, do Padova; Christian Vieri e Paolo Montero, da Atalanta; e um meia francês chamado Zinédine Zidane, adquirido junto ao Bordeaux.

O River também tinha algumas baixas: os jovens Crespo e Matías Almeyda foram cedidos para o futebol europeu, mas La Banda ainda tinha um elenco forte, liderado pelo veterano uruguaio Enzo Francescoli. A agremiação de Buenos Aires apostava em garotos, como Marcelo Gallardo, Ariel Ortega, Celso Ayala, Julio Cruz e Juan Pablo Sorín.

Sorín, diga-se de passagem, era um dos personagens do confronto. O lateral revelado pelo Argentinos Juniors foi campeão continental duas vezes em 1996, pois fez parte do elenco campeão europeu da Juventus e, ao final da temporada europeia – na qual teve discreta participação – foi contratado pelo River Plate. Juanpi disputou as duas finais contra o América e permaneceu nos Millonarios até 2000.

Eleito melhor da decisão, Del Piero marcou o gol da vitória da Juventus sobre o River Plate (JIJI PRESS/AFP/Getty)

O jogo

A partida, apitada pelo brasileiro Márcio Rezende de Freitas, começou parelha. Apesar do favoritismo alvinegro, o River Plate ousou jogar de igual para igual, mas levava pouco perigo para Angelo Peruzzi quando tentava sair para o jogo. Os italianos criaram as melhores chances nos primeiros quinze minutos, no chute de canhota de Boksic e na finalização de Zidane sem goleiro, que parou no capitão Leonardo Astrada. Na sequência, o jogo ficou morno e o árbitro encerrou a primeira etapa, sem acréscimos e sem gols.

No segundo o tempo, a Juventus conseguiu dominar o River, o que deixou ainda mais evidente a diferença entre os europeus e sul-americanos. A Juve desfrutava das subidas em velocidade dos laterais, combinada à aproximação dos meias para construir jogadas de perigo pelos flancos, com Sergio Porrini e Angelo Di Livio, pela direita, e Moreno Torricelli e Vladimir Jugovic, pela esquerda. O River, por sua vez, tinha bastante dificuldade para chegar ao ataque e teve suas principais chances a partir de chuveirinhos, já que o sistema defensivo bianconero foi muito faltoso durante o jogo.

Os Millonarios focavam em se defender e tentavam usar o “fator jogo único” em seu favor, pois sabiam que um gol em lance esporádico mudaria o andamento da partida. A estratégia quase deu certo e, depois das muitas chances perdidas por Boksic, o River teve uma rara chegada de perigo: Ortega recebeu dentro da área e acertou o travessão, na saída de Peruzzi. Na medida em que o tempo passava, a superioridade deixava de ser algo positivo e se transformava em nervosismo, já que as finalizações da Zebra paravam no goleiro Roberto Bonano.

Na reta final da partida, porém, o arqueiro argentino seria batido. Aos 36 minutos do segundo tempo, Di Livio cobrou escanteio na área e a estrela de Del Piero brilhou: o camisa 10 se desmarcou, recebeu na segunda trave e fuzilou de perna direita para abrir o marcador. O tento daria o título internacional à Juventus e coroava o excelente ano do príncipe de Turim, que tinha sido indicado à Bola de Ouro da revista France Football. Ale – escolhido como craque da final em Tóquio – ficou na quarta posição da premiação europeia, com 65 votos, atrás de Alan Shearer, Ronaldo Fenômeno e Mathias Sammer, vencedor do prêmio, com 144 votos.

Nos últimos minutos, o River foi para o tudo ou nada, mas nem assim conseguiu vencer o sólido sistema defensivo bianconero. A Juve ainda desperdiçou boas ocasiões de fazer o segundo e matar a partida. Se Boksic estivesse em uma noite inspirada, talvez o placar fosse mais elástico: o bom atacante croata fracassou em três oportunidades cristalinas. Mas o importante é que a segunda conquista mundial da Velha Senhora se concretizava. Tudo graças a um Del Piero de 22 anos, que dava seus primeiros passos para virar ídolo em Turim.

Juventus 1-0 River Plate

Juventus: Peruzzi; Porrini, Ferrara, Montero, Torricelli; Di Livio, Deschamps, Zidane (Tacchianrdi), Jugovic; Boksic, Del Piero. Técnico: Marcello Lippi.
River Plate:
Bonano; Díaz, Ayala, Berizzo, Sorín; Monserrat, Astrada, Francescoli, Berti (Gancedo); Ortega, Cruz (Salas). Técnico: Ramón Diaz.
Gol: Alessandro Del Piero (81′).
Árbitro: Márcio Rezende de Freitas (Brasil)
Local e data: Estádio Nacional, Tóquio (Japão), em 27 de novembro de 1996.

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