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Cyril Domoraud conseguiu a proeza de fracassar nos dois times de Milão

Yuri Said

Cyril Domoraud nasceu na Costa do Marfim e, desde jovem, teve de se acostumar a mudar de país. Primeiro trocou a sua terra natal pela França, onde cresceu e apareceu para o futebol. Depois disso, passou por mais de 10 clubes na carreira e mais três nações, incluindo a Itália. Entretanto, sua experiência na Velha Bota, que tinha tudo para ser brilhante, já que assinou com Inter e Milan, foi das mais decepcionantes.

Batizado como Dépri Cyrille Léandre Domoraud e apelidado de Cyril, o jogador nasceu em 1971, na cidade de Lakota, no interior da Costa do Marfim. Quando ainda era criança, sua família se mudou para a França, e ao longo de sua viência, ele adquiriu a cidadania francesa. Como se dedicou aos estudos por bastante tempo, o marfinense só decidiu se dedicar seriamente ao futebol aos 21 anos, quando assinou com o Créteil, da segundona nacional.

Domoraud caiu com o seu time para a terceira divisão no seu primeiro ano como profissional, mas voltou à segunda categoria em 1994, quando acertou com o Red Star, de Paris. No biênio em que representou os alviverdes, que lutavam por uma vaga na elite, o marfinense entrou em evidência: passou a ser convocado pela seleção de seu país e, em 1996, poucos meses após ter representado os elefantes na Copa Africana de Nações, foi contratado pelo Bordeaux.

Na época, os girondinos tentavam se reconstruir após uma temporada ruim. Assim, procuraram reinvestir o dinheiro de importantes vendas, como a de Zinédine Zidane à Juventus e a de Christophe Dugarry ao Milan, sobretudo em peças promissoras. Domoraud chegou ao Bordeaux ao lado de nomes como Ibrahim Ba, Johan Micoud e o zagueiro brasileiro Gralak, além do veterano craque Jean-Pierre Papin. Se alternando entre as funções de beque e lateral por ambos os flancos, o marfinense foi titular absoluto dos marine et blanc, que ficaram com a quarta colocação no Campeonato Francês e o vice na Copa da Liga Francesa.

Após apenas uma campanha pelo Bordeaux, Cyril se transferiu para o Olympique de Marseille, a pedido de Rolland Courbis, que havia lhe comandado nos girondinos. O técnico tratou Domoraud como insubstituível no biênio em que o versátil defensor atuou na Provença: foram 71 aparições em duas positivas temporadas para o clube da costa mediterrânea, apesar de conquistas terem ficado por um triz, em 1999. Neste ano, o OM foi segundo colocado do Campeonato Francês, um ponto atrás do Bordeaux, e perdeu a final da Copa Uefa para o Parma.

Mesmo com uma estatura mediana para atuar como zagueiro (apenas 1,81 m), Domoraud compensava a falta de centímetros com outros atributos, destacando-se principalmente pela velocidade e pela versatilidade, o que lhe garantira boas atuações até aquele momento da carreira. Assim, chamou a atenção de equipes da Serie A italiana, a principal liga da época.

O marfinense chegou à Itália com cartaz, mas fracassou (imago/Contrast)

Domoraud desembarcou em Milão para assinar com a Inter em julho de 1999, sendo que a equipe nerazzurra também decidiu buscar no Marseille o zagueiro Laurent Blanc, campeão mundial pela França. A dupla fazia parte de um esforço de redenção da Beneamata, que não conseguira repetir a ótima campanha de 1997-98 em 1998-99, e amargara apenas a oitava posição na Serie A – junto com eles chegaram mais reforços de peso, como Christian Vieri, Christian Panucci, Angelo Peruzzi, Vladimir Jugovic e Luigi Di Biagio. Para comandar a volta por cima, o presidente Massimo Moratti contratou Marcello Lippi, multivencedor pela arquirrival Juventus, que patrocinou a aquisição do marfinense.

Os nerazzurri imaginavam que Domoraud pudesse ser para a Inter o que Lilian Thuram era para o Parma – um colosso capaz de executar diversas funções defensivas. Cyril teve um início de oportunidades na Beneamata, mas mostrou limitações evidentes nas derrotas para o Milan e para o Bologna, por exemplo. Após ser usado em cinco das primeiras nove rodadas da Serie A, o marfinense foi relegado frequentemente às tribunas e integrou o banco de reservas em escassas oportunidades.

Posteriormente, Domoraud afirmou que uma lesão na virilha, sofrida na pré-temporada, teria afetado o seu desempenho. O fato é que o marfinense recebeu chances e não teve capacidade de encarar a árdua tarefa de obter a titularidade em qualquer posição da defesa nerazzurra.

Na lateral direita, realmente Javier Zanetti ou Panucci eram páreo duro, mas certamente teria sido possível atuar mais numa zaga que tinha Blanc, Francesco Colonnese, Dario Simic, Salvatore Fresi e Taribo West. E, principalmente, numa ala esquerda que tinha o contestadíssimo Grigoris Georgatos e o brasileiro Gilberto, inadaptado à Itália. Ao invés de se impor e desbancar os colegas, Domoraud teve um desempenho tão ruim que fez a Inter buscar Iván Córdoba e Michele Serena na janela de transferências de janeiro.

Domoraud ficou sem atuar da 9ª à 32ª rodada da Serie A. Por contingência, teve de participar de três outras partidas até o fim da temporada, vendo a Inter, quarta colocada, superar o Parma no desempate e garantir vaga na Champions League. Cyril também disputou o jogo de volta da final da Coppa Italia, entrando no segundo tempo contra a Lazio, que se sagraria campeã.

Depois dos oito jogos que fez em 1999-2000, Domoraud ainda atuou em três partidas, mas foi mandado embora da Inter após a precoce demissão de Lippi – que iniciou a temporada com derrota para a Lazio na Supercopa Italiana e a eliminação na fase preliminar da Liga dos Campeões para o modesto Helsingborg, da Suécia. Em setembro de 2000, foi emprestado ao Bastia, retornando à França.

Domoraud parou no Milan por conta de um acordo econômico entre os rossoneri e a Inter, mas só disputou amistosos pelo clube (imago/Contrast)

Após disputar 24 partidas naquela temporada e ajudar o time da Córsega a ficar no meio da tabela do Campeonato Francês, o marfinense retornou a Milão. Primeiro, para a parte nerazzurra, mas logo acabaria na rossonera, em um movimento envolvendo a troca pela copropriedade do lateral-direito Thomas Helveg – simplesmente uma manobra fiscal feita pelos rivais. Tanto é que Cyril não passou nem 10 dias no Milan, que o cedeu ao Monaco.

Contrastando novamente com sua passagem pela Itália, Domoraud foi titular na França, participando de 28 partidas da fraca campanha do Monaco de Didier Deschamps, que brigou para não cair para a segunda divisão. O defensor não foi comprado em definitivo pelos monegascos e voltou ao Milan, chegando a vestir a camisa rossonera em alguns amistosos. No fim das contas, Cyril foi envolvido em mais uma negociação e, já aos 31 anos, rumou ao Espanyol.

Na Catalunha, acumulou quase 70 partidas em duas temporadas, nas quais ajudou os periquitos a permanecerem em La Liga. Foram os seus últimos bons momentos por clubes na Europa, já que, na reta final da carreira, não teve brilho no Konyaspor, da Turquia, nem em sua segunda passagem pelo Créteil, então militante na Ligue 2. Por lá, chegou a ser rebaixado mesmo sob o comando do experiente técnico português Artur Jorge.

Apesar disso, Domoraud ainda tinha muito respaldo na Costa do Marfim. Em 2006, o veterano integrou o elenco dos elefantes que foi vice-campeão da Copa Africana de Nações e foi o jogador mais velho do grupo da seleção que representou o país na Copa do Mundo, na Alemanha – ainda atuou numa partida, contra Sérvia e Montenegro. No total, Cyril somou 53 aparições pela equipe nacional e quatro disputas de CAN.

Em 2007, após o Créteil ter sido lanterna da Ligue 2, Domoraud optou por encerrar a carreira na Costa do Marfim, jogando pelo Stella Club d’Adjamé, de Abidjan, maior cidade do país. O defensor ainda representou o Africa Sports, da mesma cidade, e pendurou a chuteira em 2008, aos 37 anos. Após encerrar a sua trajetória nos gramados, tornou-se assistente técnico de Sven-Göran Eriksson, treinador dos elefantes na Copa do Mundo de 2010, disputada na África do Sul.

Domoraud teve uma carreira bastante digna – e certamente a mais interessante de sua família, já que seus irmãos Gilles e Jean-Jacques tiveram trajetórias modestas como futebolistas. Só que, sem dúvidas, o seu calcanhar de Aquiles foi a estadia em Milão. Na Itália, Cyril é e sempre será lembrado como uma grande decepção. Ou como um “bidone”, em bom italiano.

Dépri Cyrille “Cyril” Léandre Domoraud
Nascimento: 22 de julho de 1971, em Lakota, Costa do Marfim
Posição: zagueiro e lateral
Clubes: Créteil (1992-94 e 2005-07), Red Star (1994-96), Bordeaux (1996-97), Marseille (1997-99), Inter (1999-2000), Bastia (2000-01), Milan (2001), Monaco (2001-02), Espanyol (2002-04), Konyaspor (2004), Stella Club d’Adjamé (2007) e Africa Sports (2008)
Seleção marfinense: 53 jogos

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