Diferentemente do Brasil, onde vários jogadores debutam e estouram com uma média de idade baixíssima, na Itália há, de praxe, uma maior proteção com os jovens da Primavera, isto é, aqueles das categorias de base do clube. Tanto é que, da seleção campeã mundial em 2006, apenas três jogadores tinham até 24 anos – o terceiro goleiro Marco Amelia, do Livorno, o volante Daniele De Rossi, da Roma, e o atacante Alberto Gilardino, do Milan. Normalmente, quando um inexperiente já surge na equipe principal, o faz por numerosas ausências no plantel titular ou por apresentar um potencial exorbitante que deve ser necessário ao time.
Ou seja, não é a qualquer momento que um grande jogador rouba um lugar de outro mais experiente apenas pelas exibições amadoras. Para testar os atletas e ao mesmo tempo não queimá-los, as equipes optam por emprestá-los a clubes mais fracos e/ou de divisões inferiores, acumulando adaptação e experiência no futebol profissional. É assim desde os tempos do “jurássico” Alessandro Costacurta, ex-Milan. Na temporada 1986-87, o defensor foi emprestado ao Monza, quando disputou 30 partidas e retornou para se eternizar em Milão.
Porém, não foi com tanta cautela assim que surgiu Nicola Ventola, atacante ágil e de bom porte físico. Com apenas 16 anos e meio, acabou estreando pela Serie A italiana na derrota do seu Bari contra a Fiorentina pelo placar de 2 a 0, em Florença, no dia 11 de novembro de 1994. Com tanto potencial, virou sombra de Ronaldo Fenômeno na Inter. Terminou a carreira como reserva de nomes bem menos garbosos, como Sasa Bjelanovic.
Nascido em Grumo Appula, na região metropolitana de Bari, o jogador só viria a igualar as tais 30 partidas de Costacurta na temporada 1994-95, graças a desfalques, entre outros, do atacante Igor Protti. Já na temporada seguinte, pelo mesmo time biancorosso, o centroavante entrava aos poucos e agradava a torcida com o curto tempo que tinha – tendo disputado apenas sete partidas e sem ainda balançar as redes. O que não o ajudou muito foi o fato de os galletti caírem para a segunda divisão.
No entanto, uma troca de treinadores no timefez com que mudasse também a atitude em relação ao jovem atacante. Após a saída do comandante Giuseppe Materazzi, pai do defensor Marco Materazzi, o Bari fechou com Eugenio Fascetti. Sem muitas escolhas, o novo professor acabou liberando o garoto para a equipe titular.
Não demorou muito para que Ventola conquistasse os corações esperançosos dos biancorossi. Militando frequentemente na Serie B, onde conseguiu juntar 29 presenças, Nicola conseguiu marcar 10 gols e despertar o interesse de equipes maiores. Comandado por suas finalizações e por outra então promessa, chamada Marco Di Vaio, o Bari conseguiria então chegar à quarta colocação, e, consequentemente, à Serie A de novo.
Na divisão de elite, Ventola dava cada vez mais sinais de amadurecimento, porém problemas físicos e concorrências pelo seu posto fizeram-no disputar apenas oito partidas, balançando as redes duas vezes. Ainda como uma das maiores promessas do futebol italiano, na temporada seguinte o atacante de 1,85 m conseguiu uma lucrativa e importante transferência para a Inter de Ronaldo. O que viria a ser uma negociação para alavancar o jogador e transformá-lo de mera promessa em um dos maiores atacantes italianos tornou-se um dos maiores fiascos do esporte nacional.
Atuando em uma Inter totalmente instável, que teve três treinadores em apenas dois anos, Nicola disputou 21 partidas e marcou seis gols pela Serie A – somando todas as competições, 11 em 37 jogos. Nem o seu tento contra os futuros campeões europeus do Manchester United bastou para que se firmasse na equipe. Com a chegada de Christian Vieri, vindo da Lazio pelo equivalente a 48 milhões de euros, Ventola perderia espaço e seria emprestado ao Bologna. Lá, passaria a temporada 1999-2000 em branco no Campeonato Italiano, apesar de ter jogado 14 partidas. Nas copas, balançou as redes quatro vezes.
Nome frequente nas seleções italianas de base, Ventola venceria com os azzurrini o Europeu Sub-21, ao lado de jogadores como Morgan De Sanctis, Christian Abbiati, Matteo Ferrari, Francesco Coco, Cristiano Zanetti, Marco Rossi, Gennaro Gattuso, Andrea Pirlo, Simone Perrotta, Gianni Comandini e Gionatha Spinesi. No torneio, deixaria o seu na vitória contra a Turquia, por 3 a 1. Nicola foi também convocado para a Olimpíada de Sidney, em 2000, num elenco que contava com seu ex-companheiro de Bari, Gianluca Zambrotta. Na Austrália, o apuliano não conseguiu marcar. No total, o atacante teve 21 jogos e oito gols pela seleção sub-21.
Até aqui, poderia se dizer com certa razão que o atacante só não havia estourado por questões de tempo, oportunidade e paciência, além de algumas lesões que o haviam atrapalhado. Passado outro ano com o ataque da Inter cheio e tantas outras trocas de treinador, Ventola foi então emprestado à Atalanta, mais uma vez na Serie A. Em Bérgamo, municiado pelo excelente Cristiano Doni, Nicola se recuperaria e faria 11 gols em 32 partidas, seguindo como uma importante promessa para o futebol italiano.
De volta à Inter, em 2001-02, Ventola novamente seria pouco aproveitado e entraria em campo somente 16 vezes, marcando quatro gols pelo Italiano, sendo um até num Derby della Madonnina, perdido or 4 a 2 para o Milan. Nas competições de mata-mata, apareceu mais e totalizou 10 bolas nas redes, sendo cinco pela Copa Uefa – torneio do qual foi um dos principais artilheiros, atrás apenas de quatro nomes.
O declínio total
A paciência com o talento da velha Bari já se esgotava, quando, para acabar de vez com qualquer esperança do atacante, a ainda conturbada Inter se reforçaria com nada mais nada menos que Hernán Crespo, vindo de uma excelente passagem de dois anos na Lazio, e Gabriel Batistuta, que vinha por empréstimo após se desgastar na Roma.
Além disso, a equipe já contava com um mais amadurecido Mohamed Kallon, o habilidoso e incisivo Álvaro Recoba e o sempre matador Vieri. Ataque numeroso, que já havia perdido Ronaldo para o Real Madrid. O resultado de todo esse inchaço para Ventola, que, ainda por cima, foi novamente atrapalhado por problemas físicos, foi uma temporada sem sequer entrar em campo.
O destino de Nicola não poderia ser outro senão sair, ou ao menos passar um tempo fora, daquela equipe em que não conseguiria espaço jamais. E foi assim que o Siena, time que até então contava com Rodrigo Taddei e os campeões mundiais Roque Júnior e Júnior, o levou por empréstimo.
E, por incrível que pareça, nem lá Ventola conseguiu se firmar – os toscanos contavam com os já experientes Enrico Chiesa e Tore André Flo para suas posições mais ofensivas, além de Nikola Lazetic. Lá, o apuliano marcou apenas quatro gols em 28 partidas, já firmando a sua imagem de eterna promessa. Os bianconeri e os interistas não chegaram a nenhum acordo de compra e, pela terceira vez, o atacante voltava a Milão.
Sua última chance? De maneira alguma. O elenco havia mudado, porém o inchaço ofensivo continuava o mesmo, com o ágil Obafemi Martins, o promissor Andy van der Meyde, o ascendente Adriano, os remanescentes Recoba e Vieri e o não menos matador Julio Cruz. Mais seis meses sem pisar nos gramados oficialmente e Ventola foi então cedido por empréstimo ao Crystal Palace, na Premier League inglesa. Perseguido por problemas físicos, o apuliano só disputaria três partidas em meia temporada, marcando um gol. Sua imagem como uma eterna promessa já estava fadada, e seu futuro, indefinido.
De volta à Itália, Nicola, já com 27 anos, retornaria à Atalanta, disposto a jogar a Serie B para tentar uma já não tão aguardada recuperação. Enchendo de argumentos aqueles poucos que afirmavam que o atacante não passava de um jogador de segunda divisão, Ventola marcaria 15 gols em 35 jogos disputados, um número agradável para quem vinha de graves problemas físicos na Inglaterra e vários psicológicos na Itália, visto que não deve ter sido muito agradável para ele nunca ter obtido uma grande sequência.
Com ele, os bergamascos conseguiriam a promoção à Serie A. Lá, na temporada 2006-07, mais uma vez tendo uma oportunidade na primeira divisão, o atacante teria então uma última chance para se recuperar. Não passou de uma pequena contribuição de seis gols em 29 partidas, não convencendo mais uma vez e consolidando definitivamente a imagem de que não alcançaria o nível que dele se esperava.
Concretamente um fiasco, Ventola então acabaria assinando um contrato de dois anos com o Torino, time com um forte meio-campo para municiá-lo, com “Il Genio” Eugenio Corini, o campeão mundial Simone Barone e “Il Piccolo Principe” Alessandro Rosina. Passados seis meses, o talento da velha Bari não conseguiu assegurar sua posição no onze inicial do time granata, principalmente com o retorno de David Di Michele, que antes havia sido suspenso por apostas ilegais. No total, disputou inexpressivas 22 partidas, marcando cinco gols. E tendo espaço comparável ao modestíssimo croata Bjelanovic, citado no início do texto.
Na descendente da carreira, Ventola não aproveitou a chance que passa na frente de alguns veteranos: se transformar, ou permanecer, um bom e muito útil jogador, atuando na função básica – mas não tão simples – de empurrar a bola para o gol. O que Nicola precisava, acima de tudo, era se firmar. E isso não ocorreu no Toro: em 2009-10, temporada que terminou com um melancólico rebaixamento à Serie B, o atacante fez somente dois gols em 16 aparições.
Ventola, então, partiu para a terceirona italiana. Acertado com o Novara apenas em novembro de 2009, com a temporada já em andamento, continuou a jogar pouco. Ao menos, celebrou conquistas, como o acesso à Serie B devido ao título da Lega Pro Prima Divisione, e o da Supercopa da Lega Pro. Na campanha seguinte, devido a recorrentes problemas físicos, mal entrou em campo e rescindiu o contrato com os azzurri em janeiro de 2011, se aposentando em seguida, antes mesmo de completar 33 anos.
Depois de pendurar as chuteiras precocemente, Ventola chegou a ser investigado por participação num esquema de manipulação de resultados, mas terminou absolvido ao fim do processo. Fora dos campos, a eterna promessa se tornou comentarista de futebol, trabalhando nos Emirados Árabes Unidos e também na Itália, onde alcançou, nos microfones, uma popularidade incomparável àquela que amealhou dentro dos gramados.
Nicola Ventola
Nascimento: 24 de maio de 1978, em Grumo Appula, Itália
Posição: atacante
Clubes: Bari (1994-98), Inter (1998-99, 2001-03 e 2004), Bologna (1999-2000), Atalanta (2001-02 e 2005-07), Siena (2003-04), Crystal Palace (2004-05), Torino (2007-09) e Novara (2009-11)
Títulos: Jogos do Mediterrâneo (1997), Europeu Sub-21 (2000), Serie B (2006), Lega Pro Prima Divisione (2010) e Superliga da Lega Pro (2010)