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Giovanni Piacentini marcou época como ‘mordedor de canelas’ por Roma e Fiorentina

Poucas escolas de futebol do planeta produziram tantos carregadores de piano eficientes quanto a italiana. Volantes formidáveis e incansáveis, como Gennaro Gattuso, Daniele De Rossi, Gabriele Oriali, Romeo Benetti e Giovanni Trapattoni fizeram a glória dos times e da seleção da Velha Bota, a ponto de ofuscar outros especialistas na função, como Giovanni Piacentini, conhecido como “escavadeira” por seus dotes agonísticos.

Giovanni nasceu em 1968, em Módena, e foi no homônimo time da cidade que começou a apresentar o futebol voluntarioso e operário que marcou a sua carreira. A trajetória de Piacentini começou aos 16 anos, nas categorias de base do canarini, e a projeção ao elenco principal foi meteórica: na Serie C1 de 1984-85, estreou entre os adultos.

O volante se consolidou na temporada posterior, na qual o Modena foi semifinalista da Coppa Italia da Serie C e, como vice-campeão de seu grupo na terceirona, conseguiu a promoção de categoria. Ruspa (“escavadeira”, em italiano) ainda foi titular absoluto na campanha que garantiu a permanência dos gialloblù no patamar atingido  e, depois da aventura no quintal de casa, migrou para o Vêneto. No nordeste da Itália, Piacentini disputou dois campeonatos da segunda divisão com a camisa do Padova.

Pelo bom desempenho demonstrado nos escalões inferiores italianos, Giovanni recebeu a sua primeira oportunidade na Serie A. Em outubro de 1989, após iniciar em alto nível a sua terceira temporada pelo Padova, Piacentini foi adquirido pela Roma, dirigida por Dino Viola e treinada por Luigi Radice. Aos 21 anos, deu um passo definitivo na carreira, visto que se manteve em evidência durante a década de 1990.

A estreia de Piacentini pela Roma ocorreu quase um mês depois de sua contratação: no fim de novembro, o volante entrou no segundo tempo de um empate por 2 a 2 com o Verona, no Marcantonio Bentegodi. No seu primeiro ano na capital, Ruspa foi utilizado como opção a Fabrizio Di Mauro e Stefano Desideri, atuando em 17 jogos, e impressionou Cesare Maldini, técnico da seleção sub-21 italiana. Dessa forma, acabou sendo convocado para a Eurocopa da categoria, em 1990, e disputou três partidas na competição. Os azzurrini foram eliminados nas semifinais, pela Iugoslávia, e a União Soviética se sagrou campeã do torneio.

Na temporada seguinte, em 1990-91, o enérgico volante ganhou maior espaço na rotação do elenco romanista e somou 33 aparições. As mais importantes foram pela Coppa Italia, nos confrontos de quartas e semifinais ante Juventus e Milan, respectivamente. Na grande decisão, que Piacentini viu de fora do campo, a Roma de Ottavio Bianchi venceu a primeira partida contra a Sampdoria por 3 a 1 e empatou na volta por 1 a 1, conquistando a sua sétima taça do torneio.

Com seriedade e truculência controlada, Piacentini e consolidou na Roma (Allstar/imago)

Esta campanha também reservou um gosto amargo para o torcedor romanista na Copa Uefa, a atual Liga Europa. A equipe chegou invicta à grande final contra a Inter, mas a derrota por 2 a 0 no Giuseppe Meazza custou o título – mesmo com a vitória por 1 a 0 no jogo de volta, no Olímpico. Piacentini disputou sete dos 12 confrontos do torneio continental, sendo uma peça-chave no sistema defensivo, embora não tenha sido relacionado a partir das semifinais: foi titular na Serie A, permitindo que Desideri, Di Mauro e Manuel Gerolin descansassem.

Em 1991-92, com as vendas de Desideri e Gerolin, Ruspa se tornou titular no meio-campo da Roma. Pau para toda obra, com muita seriedade e dedicação, também chegou a ser improvisado na lateral direita e até na zaga. Naquela mesma temporada, o emiliano ajudou a Loba a ser quinta colocada da Serie A e parar nas quartas de final das copas – na Recopa Uefa, o time capitolino caiu para o Monaco de Arsène Wenger, George Weah e Rui Barros.

Já no ano seguinte, a Roma teve participações razoáveis nos mata-matas – caiu nas quartas da Copa Uefa, eliminada pelo Borussia Dortmund, e foi vice da nacional, ante o Torino – e um desempenho ruim na Serie A, competição em que ficou apenas na 10ª posição. Um dos melhores da equipe giallorossa na temporada, Ruspa fez valer o seu apelido e, por seu estilo extremamente combativo, acumulou 13 cartões amarelos em 45 presenças.

Consolidado na Cidade Eterna, Piacentini manteve o seu posto de coadjuvante fundamental para o funcionamento da equipe entre 1993 e 1995, época em que a agremiação não obteve grandes resultados e passou por mudanças. Naquele biênio, Franco Sensi assumiu a presidência, Carlo Mazzone foi escolhido como técnico, Abel Balbo começou a ganhar status de ídolo e Francesco Totti emergiu. Calharia de ser o período em que Ruspa marcaria os seus dois únicos gols com a camisa aurirrubra.

O primeiro deles ocorreu no Derby della Capitale de 24 de outubro de 1993 – e foi um golaço. Depois de escanteio, o arqueiro biancoceleste Luca Marchegiani espalmou a bola para entrada da área, de onde Piacentini acertou um belíssimo sem pulo com a perna direita e abriu o marcador, que seria igualado pelo ex-giallorosso Di Mauro. Coincidentemente, o volante anotou um dos sete tentos de sua carreira apenas três dias depois. Pela segunda fase da Coppa Italia, ele balançou as redes na magra vitória por 1 a 0 diante do Padova, seu antigo clube, e deu a classificação para a Loba.

Em 1995, aos 27 anos, Giovanni decidiu mudar de ares depois de 189 partidas pela Roma. Assim, assinou com a Fiorentina, que vivia um momento mais glorioso do que a equipe da capital. Pela agremiação de Florença, inclusive, o volante conquistou dois títulos: uma Coppa Italia e uma Supercopa Italiana.

A Viola contava com um elenco que impunha respeito em qualquer lugar: entre os destaques, tinha o goleiro Francesco Toldo, o maestro Rui Costa e o matador Gabriel Batistuta. Vestindo a camisa 4, Piacentini foi fundamental para dar equilíbrio ao time e proteção à defesa, juntamente a Emiliano Bigica, Sandro Cois e Stefan Schwarz. Com essa estabilidade, o técnico Claudio Ranieri conseguiu levar a Fiorentina ao quarto lugar na Serie A e faturar a copa nacional. Os gigliati foram campeões com 100% de aproveitamento e, entre as oito vitórias, destacaram-se, naturalmente, aquelas sobre Inter e Atalanta, nas semifinais e na decisão, respectivamente.

Piacentini defendeu a Fiorentina por apenas dois anos, mas levantou uma taça em cada temporada (imago)

A temporada seguinte começou logo com um título: o da Supercopa Italiana, em San Siro. Piacentini atuou durante os 90 minutos da partida contra o Milan e foi um leão no meio-campo, contribuindo como um roadie para o show de Batistuta, autor de uma doppietta na vitória por 2 a 1 sobre o então campeão italiano. Ruspa ficou perto de levantar a terceira taça pela esquadra violeta, mas a Fiorentina esbarrou no Barcelona de Ronaldo, Luís Figo e Hristo Stoichkov na semifinal da Recopa de 1996-97.

Com o passar do tempo e a chegada do técnico Alberto Malesani, o volante foi perdendo espaço no time. Em dezembro de 1997, após iniciar apenas quatro das 16 partidas da Fiorentina, sendo três delas pela Coppa Italia, Piacentini assinou com a Atalanta, que lutava contra o rebaixamento. Ruspa se tornou titular da equipe nerazzurra, porém não conseguiu evitar o descenso dos bergamascos para a Serie B. Giovanni permaneceu para tentar reerguer o clube, mas a Dea não passou da sexta posição na categoria inferior.

Logo no início da temporada 1999-2000, Piacentini voltou à primeira divisão e à sua Emília-Romanha. A escavadeira humana acertou com o Bologna e teve um ano razoável pelo time rossoblù, sendo utilizado com frequência por Francesco Guidolin – o duro meio-campo dos felsinei ainda tinha Zé Elias, Giancarlo Marocchi e Klas Ingesson. Após se tornar, aos olhos do treinador, apenas uma peça de segunda etapa na campanha seguinte, o volante decidiu se aposentar, aos 33 anos.

Diferentemente do usual, as razões para o fim de carreira precoce de Giovanni não foram físicas. A verdade é que, jogando na Emília-Romanha, onde nasceu, ele pode acompanhar de perto os negócios da família no ramo da construção civil e, ao ajudar no que podia, seu interesse na área foi despertado – algo apropriado, considerando o seu apelido. Para além disso, Piacentini gostava de transmitir sua experiência aos mais novos no futebol, mas se mostrava saturado pelas mudanças econômicas oriundas da Lei Bosman. Por esses dois motivos, pendurou as chuteiras mais cedo.

Atleta multitarefa no centro do gramado, Piacentini nunca se importou de fazer o que muitos consideram a parte suja do jogo: afinal, deixar a técnica de lado e ter o coração na ponta da chuteira foi o que lhe levou aos grandes palcos do futebol italiano e internacional. Sua dedicação foi indispensável para o sucesso das equipes que defendeu e, não à toa, é sempre lembrado pelos torcedores de Roma e Fiorentina.

Giovanni Piacentini
Nascimento: 9 de abril de 1968, em Módena, Itália
Posição: volante
Clubes: Modena (1984-87), Padova (1987-89), Roma (1989-95), Fiorentina (1995-97), Atalanta (1997-99) e Bologna (1999-2001)
Títulos: Serie C1 (1986) Coppa Italia (1991 e 1996) e Supercopa Italiana (1997)

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