Na década de 1990, o Parma viveu os seus anos dourados. Dono do clube à época, Calisto Tanzi abastecia os crociati com o dinheiro da Parmalat, também de sua propriedade, e formava times competitivos. No início da década de 2000, um escândalo levou à falência da gigante de laticínios e ao início da derrocada dos ducali, mas isso não impediu que grandes jogadores surgissem no meio do caminho. Um deles foi o meia Marco Marchionni, que se tornou a referência técnica da equipe em seus momentos mais complicados.
Marchionni nasceu em 22 de julho de 1980, em Monterotondo, uma pequena comuna localizada nas imediações de Roma. Foi na cidadezinha com menos de 35 mil habitantes que ele começou a sua carreira: aos 17 anos, já atuava no homônimo clube local, que disputava a quinta divisão italiana.
A versatilidade do jovem meia, que podia atuar tanto como ponta quanto como trequartista, chamou a atenção do Empoli, que o contrataria em 1998. Marchionni concluiu a sua formação pela prestigiosa base azzurra, com a qual faturou a Copa Viareggio, em 2000. Antes disso, Marco já havia estreado na Serie A, em janeiro de 1999.
No mesmo ano do debute na elite, Marchionni foi rebaixado junto com o Empoli. Na segundona, ganhou mais minutos em campo e, em 2000-01, se tornou titular absoluto do time toscano. Os azzurri terminaram aquela temporada na quinta colocação da Serie B, mas Marco ganharia uma promoção à elite, ao acertar com o clube em que se consagraria.
O Parma ainda colhia os frutos da vitoriosa década anterior: nas três temporadas anteriores à contratação de Marchionni, os crociati ganharam a Copa Uefa, a Coppa Italia e a Supercopa Italiana. No entanto, os tempos de glória se aproximavam do fim por dois fatores. O primeiro foi a saída de muitos jogadores daquele time histórico e de seu próprio treinador, Alberto Malesani; o segundo – este sim, o principal – foi o escândalo da Parmalat. Tanzi foi condenado por fraude e corrupção, além de ser obrigado a declarar a falência de sua empresa e a vender o clube. Isso mudou definitivamente os rumos da agremiação.
Enquanto o imbróglio se desenrolava, Marchionni viveu a sua primeira passagem pelo Parma. Seu ano de debute foi marcado por aquele que seria o último título do clube antes da falência da Parmalat: a Coppa Italia de 2001-02. Tido como opção de banco na Serie A, Marco foi mais utilizado nos mata-matas e contribuiu com dois gols e uma assistência na vitoriosa campanha dos crociati. O passe decisivo, a propósito, se deu na partida de ida da decisão contra a Juventus. Naquela mesma época, o meia disputou a Euro Sub-21 como titular da seleção treinada por Claudio Gentile.
Apesar disso, o meia de 22 anos não obteve espaço na equipe do Parma na temporada seguinte e foi emprestado ao Piacenza, que também disputava a Serie A. Pelos biancorossi, Marchionni teve mais tempo em campo e ganhou experiência, mas não conseguiu evitar o rebaixamento do time. Assim, retornou ao clube crociato em 2003, na época em que o escândalo da Parmalat ganhou força. E, tal qual o tumulto na empresa, Marco explodiu de vez.
Sob o comando de Cesare Prandelli e ao lado de várias jovens promessas, como Hidetoshi Nakata, Daniele Bonera, Alberto Gilardino e Adrian Mutu, além dos brasileiros Júnior e Adriano, Marchionni fez seis gols em 35 jogos, ajudando a levar o Parma ao quinto lugar na Serie A e à conquista de uma vaga na Copa Uefa – tudo isso enquanto, fora de campo, a situação societária se esfarelava. Além disso, o meio-campista também garantiu sua primeira convocação para a seleção italiana, treinada, na época, por Giovanni Trapattoni. Sua estreia aconteceu numa derrota por 3 a 1 para a Polônia, em amistoso realizado em novembro de 2003.
Durante o verão europeu de 2004, o Parma deixou de ser propriedade da família Tanzi e passou a ser gerenciado por Enrico Bondi, curador falimentar, que tinha a responsabilidade de encontrar um dono dono para o clube. Com recursos escassos, o time teve de vender a maior parte de seus jogadores valiosos e investir em pratas da casa e em algumas poucas revelações, como o próprio Marchionni. Dessa vez, Marco seria treinado por Silvio Baldini, que já o conhecia desde os tempos de Empoli.
A nova parceria entre os dois, contudo, não durou um turno inteiro da Serie A: maus resultados levaram à troca do comandante, que foi substituído por Pietro Carmignani. Em campo, Marchionni foi essencial para que o Parma resistisse e evitasse, de maneira quase heroica, o rebaixamento para a segundona e, além disso, alcançasse as fases finais da Copa Uefa.

Na Juventus, Marchionni disputou a segunda divisão e conseguiu ser titular no último de seus três anos pela equipe (AFP/Getty)
Mesmo com os diversos problemas dentro e fora de campo, os crociati chegaram às semifinais da competição europeia, mas não resistiram ao CSKA Moscou – perdendo, inclusive, por um sonoro 3 a 0 no jogo de volta. Marchionni, porém, não disputou nenhum dos duelos contra os russos, pois lesionou o menisco em março, ainda na altura das oitavas, e perdeu o restante daquela temporada.
Já recuperado, o meia teria a sua melhor temporada pelos crociati em 2005-06, quando o técnico Mario Beretta fez questão de não mantê-lo restrito à ponta direita: naquele ano, Marchionni atuou várias vezes como um autêntico camisa 10 e até na função de segundo atacante, em suporte a Bernardo Corradi. Assim, Marco anotou quatro gols e forneceu cinco assistências em 31 jogos, sendo fundamental para que o Parma ficasse tranquilo no meio da tabela da Serie A.
Os ducali terminariam rebaixados dois anos mais tarde, mas Marchionni não estava mais na Emília-Romanha para tentar evitar este destino. Durante a temporada 2005-06, o meia foi abordado pela Juventus, equipe pela qual assinou um vínculo válido para a campanha seguinte – afinal, seu contrato com o Parma estava se encerrando. Antes mesmo de aportar em Turim, Marco foi pré-convocado para a Copa do Mundo de 2006, mas não chegou a ser incluído na lista final de Marcello Lippi.
Além de ter ficado de fora do Mundial, Marchionni teve as suas expectativas redimensionadas no que dizia respeito à sua transferência para a Juventus. Afinal, a Velha Senhora fora punida com o rebaixamento por participação de diretores no Calciopoli, um escândalo de manipulação de resultados que abalou o futebol italiano. Marco até poderia ter optado por ir à justiça na tentativa de anular o contrato firmado, mas entendeu que a chance de defender a equipe bianconera era única. Valeria a pena disputar a Serie B novamente, portanto.
Havia figurinhas carimbadas naquele time da Juventus. Gianluigi Buffon, Giorgio Chiellini, Alessandro Del Piero, Mauro Camoranesi, Pavel Nedved e David Trezeguet toparam disputar a segundona. A comissão técnica seria comandada por um jovem Didier Deschamps, que havia vestido a camisa bianconera como jogador e teria a oportunidade de ser treinador da equipe. Assim, não foi nenhum grande desafio faturar a taça da Serie B naquele ano e garantir o imediato retorno à primeira divisão. Para Marchionni, a temporada não fugiu do roteiro: como reserva de Camoranesi, atuou 25 vezes na vitoriosa campanha, sendo 13 como titular.

Na Fiorentina, o meia reencontrou Prandelli, mas acabou relegado ao banco após a saída do técnico (imago/Gribaudi/ImagePhoto)
O ano seguinte foi complicado para Marchionni, que só pode atuar em 14 partidas. O meia perdeu boa parte da temporada 2007-08 por lesões no pé esquerdo: uma fratura parcial do quinto metatarso, sofrida em treinamento da seleção italiana, lhe afastou por três meses; depois, num jogo da Coppa Italia contra a Inter, uma entorse lhe deixou de molho por mais 60 dias.
Em 2008, a situação mudou e o afetado por lesões foi Camoranesi, o que permitiu que Marchionni atuasse mais vezes e até se tornasse titular. Com um gol e cinco assistências, o meio-campista ajudou a Juventus a ser vice-campeã italiana e, ao final da temporada, foi envolvido numa troca com a Fiorentina, que negociou Felipe Melo com a gigante de Turim. Depois de 78 aparições, sete tentos e 10 passes decisivos, Marco encerrava a sua experiência pela equipe do Piemonte.
Vestindo a camisa violeta, Marchionni reencontrou Prandelli, seu antigo técnico no Parma, além de Sébastien Frey, Marco Donadel, Gilardino e Mutu, com quem dividiu os vestiários na Emília-Romanha. Pela Fiorentina, foi utilizado quase sempre como ponta e, em sua temporada de debute, ajudou a equipe a fazer uma ótima campanha na Liga dos Campeões – os gigliati foram eliminados de forma polêmica pelo Bayern de Munique, nas oitavas de final. Nesse mesmo ano, o meia recebeu suas últimas oportunidades na seleção italiana.
A Nazionale, aliás, acabou abreviando o seu sucesso em Florença – ao menos indiretamente. Em 2010, Prandelli substituiu Lippi no comando da Itália, após o insucesso dos azzurri na Copa do Mundo, e Sinisa Mihajlovic se tornou o técnico da Fiorentina. Marchionni, que já tinha 30 anos, até foi titular no início da trajetória do sérvio na Toscana, mas foi perdendo espaço progressivamente e, em 2011-12, quase não entrou em campo. Assim, no final da janela de mercado que abriu a temporada seguinte, o meia rescindiu o seu contrato com a Viola e encerrou a sua passagem pela equipe gigliata com 75 aparições, nove gols e oito assistências.
Alguns dias depois de terminar seu vínculo com a Fiorentina, Marchionni retornou ao Parma a custo zero. No clube em que havia se consagrado, Marco se reinventou, devido a uma sugestão de Roberto Donadoni, técnico do time à época. O treinador foi um grande ponta em seus tempos de jogador e entendia que o novo reforço teria dificuldades de atuar pelos flancos, devido à idade (32 anos) e a seu histórico de lesões. A qualidade individual, porém, estava intacta. Assim, lhe propôs um novo posicionamento, como meia central. Deu certo.
Em seu trabalho no Parma, Donadoni sempre optou por um meio-campo com três homens, no 4-3-3 ou no 3-5-2. No primeiro ano sob as ordens do técnico, Marchionni jogou frequentemente pelo lado esquerdo do setor e agradou: foi titular absoluto numa campanha razoável dos ducali, que ficaram na décima colocação. Na temporada seguinte, o comandante experimentou utilizar Marco em uma nova função, como regista, e os crociati tiveram desempenho ainda melhor, com o veterano sendo seu pilar no centro do gramado. Os parmenses ficaram com o sexto lugar e só não faturaram vaga na Liga Europa porque a Uefa não lhes forneceu a licença necessária por atraso no pagamento de impostos.
O calote que o Parma deu antecipava mais uma falência – que ocorreria em 2015. A complicada situação do clube fez com que, novamente, Marchionni deixasse a Emília-Romanha. Desta vez, em definitivo: após 201 partidas, 21 gols e 24 assistências com a camisa gialloblù, o meia se transferiu para a Sampdoria. Em Gênova, esquentou banco de forma impressionante: foi relacionado para 36 jogos e atuou em apenas três, permanecendo como opção nas demais. Ou nem isso, já que sua forma física não era das melhores.
Prova disso é que, após deixar a Sampdoria e a Serie A, Marco quase não entrou mais em campo. Em duas temporadas, atuou somente seis vezes pelo Latina, na segundona, e amargou uma nova falência, acompanhada de rebaixamento. Depois disso, reencontrou Baldini na Carrarese, da terceira divisão, e somou apenas oito aparições antes de se aposentar, aos 38 anos. De imediato, Marchionni se tornou assistente do comandante no próprio clube apuano.
Marchionni teve dois anos de aprendizado com Baldini e, em 2020, partiu em voo solo: assinou com o Foggia, que estava na Serie C, e estreou com resultados medianos. Na sequência, acertou com o Novara, da quarta divisão, e comandou uma campanha de acesso à terceira categoria. Apesar do sucesso, deixou o cargo uma vez, por conta de atritos com a diretoria, e retornou posteriormente, sem produzir um trabalho muito consistente. O mesmo ocorreu no Potenza, em seguida.
Marco Marchionni
Nascimento: 22 de julho de 1980, em Monterotondo, Itália
Posição: meio-campista
Clubes: Monterotondo (1997-98), Empoli (1998-2001), Parma (2001-03, 2003-06 e 2012-14), Piacenza (2003), Juventus (2006-09), Fiorentina (2009-12), Sampdoria (2014-15), Latina (2015-17) e Carrarese (2017-18)
Títulos como jogador: Coppa Italia (2002) e Serie B (2007)
Clubes como treinador: Foggia (2020-21), Novara (2021-22 e 2023) e Potenza (2023-24)
Título como treinador: Serie D (2022)
Seleção italiana: 6 jogos